terça-feira, fevereiro 24, 2009

encontros e despedidas

Como todo o mundo, vi nos jornais e na internet a noticia do avião da Continental que caiu em Buffalo, nos Estados Unidos, no dia 12/2, matando a tripulação e todos os passageiros, inclusive dois músicos da banda de Chuck Mangione. Mas a ficha só me veio cair agora, quando recebi um email de minha amiga Jeanie Bryson: o companheiro dela, Coley, era um desses músicos.

Jeanie é uma cantora maravilhosa, da estirpe de Peggy Lee e Julie London, como Diana Krall também é. São cantoras de voz pequena, mas espertas no uso de seus recursos. Intimistas, sexies, tirando partido das palavras e dos sons, usando e abusando de um humor super-cool. No caso de Jeanie, o fato de ela ser filha de um gigante do jazz como Dizzy Gillespie não ajudou muito sua carreira. Ela sempre se manteve `a margem do nome do pai, ficando mais ligada sempre `a mãe, a poeta e letrista Connie Bryson, que teve a audácia (para uma mulher branca na década de 60) de criar sozinha uma criança resultante de um relacionamento com um músico famoso, negro e casado _ que só foi assumir a filha muito mais tarde. Jeanie, portanto, em matéria de origens, é uma espécie de Barack Obama do jazz. Se fosse brasileira, ninguém acharia nada de mais, essa mestiçagem é 100% coisa nossa; nos Estados Unidos, infelizmente, isso já não é tão comum, mesmo no ambiente livre da música.

Eu e Jeanie nos conhecemos na primeira vinda dela ao Rio, ainda nos anos 90, quando ela foi assistir a um show que eu fazia no Arpoador. Eu e Tutty a levamos a uma roda de samba no Sobrenatural, em Santa Teresa, onde ela se divertiu bastante. Daí para a frente, nunca mais perdemos contato, e tanto eu vi seus shows seguintes, quando ela voltou ao Rio, quanto ela foi me ver em NY nos meus. Fiquei feliz quando, num desses shows novaiorquinos, ela veio ao meu camarim e me apresentou seu novo marido, Coley (Coleman Mellett), um guitarrista de jazz bastante jovem e muito talentoso. Os dois estavam obviamente felizes juntos, vivendo aquela mistura de música e vida em comum que aqui em casa conhecemos muito bem, onde um alimenta o outro com idéias e sons.

Ainda no ano passado, recebi de Coley seu primeiro CD solo, que abre com uma bossa chamada 'For Joyce', composição dele dedicada a mim. Fiquei mais do que lisonjeada: quando um músico faz esse tipo de homenagem a outro músico, isso tem um significado muito especial. Como dizem os rappers: respect.

Entro agora na página dele no myspace, e lá está o 'For Joyce', com mais de 20 mil acessos. Neste momento em que escrevo, a cerimonia do seu memorial deve estar rolando lá em New Jersey, onde eles moravam. Torço para que minha amiga tenha fé e coragem numa hora dessas, e possa sacudir a poeira e dar a volta por cima. Com música e paz.


sábado, fevereiro 21, 2009

o que é um nome?

Esse foi o nosso comunicado de casamento em 2001, quando resolvemos botar no papel o grande amor. De lá pra cá, toda vez que eu tinha de dar meu novo nome civil (Joyce Moreno) sempre perguntava a mim mesma por que não usar no trabalho o nome que agora era meu por direito.

O mundo está cheio de artistas que usam Moreno como pseudonimo, e nem são nossos parentes. Quando você vai ver, o nome real da pessoa geralmente é Silva, Santos, Pereira, Oliveira ou outros sobrenomes brasileiros comuns. Moreno tem uma sonoridade bonita para música, e talvez por isso faz tanto sucesso no meio. Aqui em casa, minha filha Clara foi a primeira a adotar, embora no caso seja o nome do padrasto e não do pai biológico. Com certeza o oxímoro embutido no nome Clara Moreno deve ter sido um dos motivos, junto com o fato de ela ter sido criada pelo Tutty a partir dos 6 anos. Mas estou divagando, não é essa a questão.

O caso é que resolvi assumir, a partir deste ano da graça de 2009, o nome Joyce Moreno em meu trabalho também. Não usar sobrenome é um inconveniente. Quando, no inicio de minha carreira, a gravadora achou que Joyce era suficiente para ser meu nome artistico, isso não me pareceu estranho, pois havia muitas outras cantoras de um nome só na música brasileira. Mas `a medida que o tempo foi passando, outras Joyces foram aparecendo na área, umas legítimas, outras falsas. Cantora evangélica, de axé, aspirante a cantora, concorrente de reality show na Holanda, tudo isso com o meu mesmo nome já me apareceu, sem falar na infame dupla Tom e Joyce, dois franceses espertinhos se fazendo passar por vocês sabem quem. Sem mencionar que Joyce é um nome bastante comum fora do Brasil. Pra quem vive com um pé aqui e outro no mundo, como eu, `as vezes isso fica complicado ("The Brazilian singer who uses her first name only". Ah!). E aqui mesmo, quantas vezes não ouvi do outro lado da linha um "ah, Joyce cantora!" como se 'cantora' fosse sobrenome de alguém.

Depois de uma visitinha ao Google, onde encontrei mais entradas em relação a meu trabalho para Joyce Moreno do que para Joyce tout court, tomei a decisão que vos comunico neste momento: daqui pra frente, Joyce Moreno serei, tanto na música quanto já sou no mundo real dos bancos e documentos. Segundo pude ver, tenho duas homonimas no mundo: uma senhora australiana que fabrica bonecas e uma jogadora de futebol panamenha. Não acredito que nenhuma das duas vá entrar em rota de colisão comigo.

Meu domínio na web também muda a partir de agora, deixando pra trás o velho joyce-brasil.com (solução visivelmente intermediaria) e aparecendo gloriosamente como www.joycemoreno.com. Espero que o pessoal se acostume logo. Eu já me acostumei, e estou adorando!


domingo, fevereiro 15, 2009

velhos no ano 2000

Leio que Jane Fonda, 71 anos, que também tem seu blog, tem escrito sobre a passagem do tempo e como administrá-la. Estava inclusive começando a escrever um livro sobre o assunto, quando lhe apareceu uma temporada na Broadway, oito espetáculos por semana. Melhor, impossível. Não há como se ficar deprimida com um ritmo de trabalho desses. God bless.

Sempre me pergunto, por exemplo, como foi que minha mãe aguentou a aposentadoria, depois de 38 anos de trabalho diário de 9-`as-5. Ela ia `a praia, nadava, lia muito, ajudava a mim e a meus irmãos quando precisávamos de algum suporte com nossos filhos e filhas. Também tinha seus momentos de nostalgia do trabalho no Ministério da Fazenda, conversando com antigas colegas e descobrindo novas formas de investir dinheiro (talento que infelizmente não herdei), o que para ela era diversão garantida. Era uma pequena investidora de classe média, mas extremamente esperta. Se dispusesse de mais capital, teria ficado rica, mesmo naqueles tempos de inflação. Nessa ela foi levando seu tempo ocioso, até os 90 anos de idade. Lúcida e fazendo palavras cruzadas.

Enfim, minha mãe e Jane Fonda, personalidades totalmente incompatíveis, entraram neste post como uma improvável mistura de siri com Toddy, por causa da repórter. Ela me procurou para uma matéria sobre o dia internacional da mulher. Já estou acostumada com isso, e respondo meio no piloto automático: esta é uma data em que, de alguma forma, sempre sou lembrada pra falar sobre o meu, o dela, o nosso genero. Ia eu, portanto, seguindo pela estrada costumeira, quando me dei conta de que não, ela não queria falar sobre meu trabalho, e sim sobre minha faixa etária.

Tomei um susto, pois ainda não me tinha caído a ficha de que ao ultrapassar a singela marca dos 60, além dos beneficios da meia-entrada, recebemos o bônus de ser considerados cidadãos de terceira idade. Levei uns trinta segundos para me refazer, ao fim dos quais, depois de explicar `a minha entrevistadora que não se fazem mais velhos como antigamente, disse a ela mais ou menos o seguinte:

Cara repórter: sei que o que você quer ouvir de mim se refere a tudo o que no momento não me interessa. Sei também que o motivo de você me procurar para esta alentada entrevista é o fato de eu ter entrado, assim de um dia para o outro, em idade provecta, ainda usando jeans e tênis. Você quer saber meus truques de beleza, meus segredos de sobrevivencia, quer que eu sirva de exemplo para outras senhoras na mesma faixa etária. Acho que não vai dar, sorry. Você me pergunta como me sinto aos 61 anos. E eu lhe afirmo, com toda sinceridade: não faço a mínima idéia. Não faço mesmo, e isso não é uma frase de efeito. Está aí um assunto que ainda não me tinha passado pela cabeça. Como me sinto? Deixa eu pensar um pouco. Um pouco mais esperta, possivelmente. Somos tão bobinhas na juventude. Mas posso garantir que me sinto mais capaz do que nunca quando o assunto é o meu trabalho. O que eu sei hoje sobre o meu ofício, eu não sabia há quarenta, trinta ou vinte anos atrás. Cada dia que passa é um dia em que conheço um pouco mais de mim mesma e redesenho meu lugar no mundo. Se estou mais ou menos feliz com isso, é outra questão. Uns dias estou, em outros quero fugir voando para uma praia do Caribe e arrumar um emprego num bar de hotel. Sério.

E o amor, você pergunta? Ah, l’amour! Oui, bien sûr, é muito bom, é bom demais, mas você não quer saber sobre amor, confesse. Amor aqui na entrevista é assim uma espécie de nome artistico para sexo, certo? Pode dizer logo. Você não usa a palavra porque acha que vai me escandalizar, mas foi você quem ficou chocada ao saber que eu durmo com o mesmo homem há trinta anos e ainda acho ótimo. Aliás, se durmo é justamente porque ainda acho ótimo. Ficou confuso pra você? Pois é, eu avisei. Não se fazem mais velhos como antigamente.

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quinta-feira, fevereiro 12, 2009

rapidinhas

Fui injusta com o verão do Rio. Continua lindo, apesar de confirmar o velho ditado carioca de que o Rio tem duas estações: verão e inferno. O inferno acontece no momento, embora exatamente neste instante uma chuva esteja caindo, o que pode significar duas coisas: um refresco para o calorão ou catástrofe na cidade. Espero que fiquemos no refresco. Chuva preguiçosa, chuva lavadeira.

O mar esteve divino nos ultimos dias. E não, meu caro leitor Anonimo, não quero expulsar os invasores da praia: leia de novo o post abaixo. Regras de convivencia para que todos sejam felizes. Quem ama, cuida. Praia limpinha, para que aquela canção do meu parceiro Jards Macalé nunca mais precise ser cantada: "vamos a la playa/ pegar conjuntivite/ talvez uma cistite/ ou quem sabe uma hepatite..."

Já que falei nele, olha ele aí! Amigo ipanemense de longuíssima data, nossos sonhos juvenis de amor e música, os amigos que se foram, os que continuam sendo e os que ficaram pra trás. Caminhos diferentes, mas sempre o mesmo carinho. E muita risada, sempre, sempre!

E foi-se Blossom Dearie, the little jazz bird. Seus amigos Gil e Miles devem estar fazendo a festa no céu do jazz. Que bom que ainda deu pra vê-la ao vivo, no Danny's Skylight Room, em Manhattan, um restaurante especializado em lagostas, meio sem-vergonha, com um pequeno clube nos fundos onde ela cantava uma vez por semana, já na flor dos seus oitent'anos. Eu era fã total, e até gravei no meu CD 'Banda Maluca', de 2005, uma música do repertório dela, 'L'Étang', de Paul Misraki. Gravei porque estava apaixonada pela canção, mas a verdade é que a gravação dela é incomparável, sublime, mesmo naquele francês pavoroso.

E chove.


domingo, fevereiro 08, 2009

verão carioca

Sempre aconselho meus amigos de fora do Brasil a não programarem sua vinda nesta época. É quando o Rio de Janeiro vira uma caricatura de si mesmo, com todos os estereótipos se confirmando. O calor é insuportável, as praias superlotadas, as pessoas ficam mais espaçosas, barulhentas, e achar um cantinho na areia para chamar de seu é quase uma utopia. Uma praia, então, para chamar de sua, mais ainda. Praia é o grande lazer do carioca, sem dúvida. Mas de fato, quem vem sem o compromisso de cuidar não merece este prazer. O que se vê é cada vez mais gente ocupando o espaço sagrado `a beira-mar sem a mínima noção de que alguma etiqueta é possível e algumas regras de convivencia devem ser cumpridas, para que todos possam ser felizes.

Ipanema e Arpoador, nossos points queridos, onde cresceram nossas gerações _ no plural mesmo, pois estou falando desde minha mãe, na década de 40, até minhas filhas, outros 40/50 anos depois _ viraram micos absolutos, intransitáveis nos finais de semana. Copacabana já estava micada desde a minha adolescencia, com as possiveis exceções do Leme e do meu Posto Seis. Já nessa época a majestosa Princesinha, condenada por sua excessiva beleza, ficava dividida entre turistas locais de bairros distantes _ empenhados em jogar areia uns nos outros, e invariavelmente abandonando seu lixo na saída _ e turistas internacionais, com mocinhas prestimosas ao redor. O Posto Seis de então ainda era o paraíso, com sua capelinha, a colonia de pescadores, as amendoeiras e a percepção de que eu e minha turma nadávamos dentro de um cartão postal. Isso foi há mais de quatro décadas atrás, e não durou até hoje.

Indo ainda mais longe, inesquecível foi o meu primeiro reveillon em nossa recém-construída casa do Recreio, ainda no início dos anos 80. Na manhã do dia 1º, animadíssima, levei minhas crianças `a praia _ para quase em seguida fugir apavorada, depois de encarar todo o lixo da véspera, que ia de camisinhas usadas a uma (perdão) cabeça de bode, certamente resquicio de algum ritual esquisito de ano novo. Hoje, com a Linha Amarela despejando gente em toda a extensão da Zona Oeste, Barra e Recreio viraram um mafuá de churrasquinhos e pagode (ou funk) nas caixas de som (altissimo!) a céu aberto. Longe pra burro, ainda por cima... Nem pensar.

Restava o Leblon, onde, graças `a má fama de suas águas, revoltas e nem sempre muito limpas, ainda era possível se chegar numa boa. Periga não acontecer mais, a partir do momento em que deu no jornal: o novo point deste verão encontra-se justamente lá, na altura da Rainha Guilhermina. É sempre assim: inventa-se um point (nos ultimos verões, tinha sido o Coqueirão, em Ipanema), que artistas e alguns descolados passam a frequentar. Chama a atenção, a imprensa noticia, e no domingo seguinte, lá está o lugar secreto repleto de turistas acidentais. É a senha para que se procure um outro local. A praia da moda é itinerante, o que não deixa de ser bom para os moradores.

Minha mãe sempre dizia que um carioca deve escolher sua moradia em algum lugar onde possa chegar na praia a pé. Uma sábia, e com visão de futuro: achar uma vaga para estacionar no verão é missão quase impossível. Aqui onde moro, minha praia vai acabar sendo a Lagoa Rodrigo de Freitas. Pelo menos fica bem ao lado.

PS- na foto, de 2004, a praia de Ipanema sossegada, num dia de semana, bem cedo. O horário dos bebês é o melhor.


segunda-feira, fevereiro 02, 2009

possibilidades mil

Começando pelos encontros com João. Nossa parceria vai de vento em popa, músicas novas pintando, muitas ideias bacanas. Ele anda numa fase maravilhosa, como há muito não se via. Feliz, sereno e criativo. Já estaremos juntos (com Emilio Santiago e Ricardo Silveira) em Portugal, em março próximo. Outras possibilidades incluem gravar de novo juntos. Se possivel, muito em breve. Adoro tudo que ele faz.


Eu e Dorivalzinho, dupla divertida. Afinidade que já dura décadas, velha amizade, tudo de bom. Nosso querido Roberto de Oliveira, que dirigiu meu ultimo DVD, gostou da mistura e propôs gravar mais desse encontro, de repente como um duo. Ele diz que eu e Dori somos como a Bela e a Fera _ a Bela é ele.

Metade da banda. Um quarteto que tem dado muito certo _ não que as formações anteriores não dessem, mas essa tem ficado pra lá de especial. Portanto, a tentativa é de se gravar sempre que possível. E as possibilidades acontecem. Sempre que nos encontramos (o que não é tão simples, dadas as agendas de todos), o combinado é tentarmos entrar em estúdio. Vamos tentar de novo em breve. Mas se não rolar, já temos um DVD gravado ao vivo no Blue Note Tokyo, ano passado, que podemos tirar da manga a qualquer momento, pois depois que a TV Fuji acabar de exibir (é um especial de TV), podemos pleitear transformar isso num 'produto' para lançamento.

Música é a maior diversão. E `as vezes até nos pagam pra fazer.