domingo, setembro 11, 2011

I love NY


Hoje se completam 10 anos do dia em que nossa cidade amada, New York, sofreu o atentado que derrubou as torres do WTC. Por aqui hoje só se fala nisso: onde se estava, qual a primeira sensação ao ver/ouvir a notícia, etc.

Eu me lembro muito bem de onde estava (no Rio, com minha filha mais nova), e sei que o Tutty estava em SP (ensaiando com amigos), e também lembro da sensação geral de que aquele filme estava sendo real demais. Mas não posso esquecer que, infelizmente, alguns apressados e/ou inconsequentes chegaram a dizer: "bem feito", sem se dar conta de que ali entrava o Terceiro Milênio, e seu começo não era uma promessa de paz. E de que nunca mais nossas vidas seriam as mesmas. E que o mundo, que parecia tão ao alcance de todos, iria ficar cada vez mais difícil de se percorrer.

New York tem suas durezas e dificuldades. Tem aquela famosa 'New York attitude', que não respeita nem furacão. Tem o esnobismo de dizer "if I can make it there, I'll make it anywhere". Tem aquele pessoal que fica no balcão e bate com a grade do guichê na sua cara. Tem a frase-símbolo dos novaiorquinos - "it's your problem" e sua variante, "I don't care" (que em Paris se chama "desolé", e aqui no Brasil começa com a letra F).

Mas amamos essa cidade. Foi onde eu e meu companheiro nos conhecemos e nos apaixonamos. Onde duas de nossas quatro filhas moraram por algum tempo. Onde também passamos poucas e boas. Ainda é - e sempre será, acredito - um imperdível lugar de música e de todas as outras artes. E é, sim, a capital do mundo, onde tem de tudo um muito.

Em 2000 - um ano antes do atentado, portanto - eu escrevia uma coluna semanal no jornal "O Dia". Voltando de uma tour americana, escrevi o texto abaixo sobre uma adorável figura novaiorquina, que conheci de passagem. Segue aqui, então, em 11 de setembro de 2011, este modesto tributo à minha cidade tão querida.

GENTILEZA


(publicado em 10/8/2000)


Lyonette deve andar pelos seus 70 anos, ou quase. Trabalha no café da livraria Barnes and Noble (filial Chelsea, 6ª Avenida, em Nova York), usa um uniforme preto com aventalzinho branco de garçonete e prende os cabelos com uma rede que me faz lembrar alguma coisa boa da minha infância, nas profundezas dos anos 50. Terá sido por isso que gostei tanto dela? O cabelo preso com rede terá talvez me levado de volta ao quarto da Nercília, que trabalhava em nossa casa, comprava “A Modinha Popular” e sumiu com um namorado num dia de carnaval.

Talvez Nercília tenha envelhecido com a cara de Lyonette. Talvez Lyonette seja uma Nercília americana, já cansada de muitos carnavais, hoje atendendo num balcão de cafeteria. Ela deve ter filhos e netos, uma família, uma igreja, uma comunidade a que pertence. Trabalha na Barnes and Noble de segunda a sábado, horário integral, servindo cappucinos e croissants para novaiorquinos estressados. E no entanto, Lyonette é uma pessoa gentil. Coisa rara, raríssima em Nova York, onde cada vez mais é cada um por si e salve-se quem puder.

Tomar café da manhã dentro de uma grande livraria, que tem praticamente qualquer livro que se queira, é um prazer que pode ser facilmente estragado por um mau atendimento. Novaiorquinos são assim mesmo: não estão nem aí para você ou seus problemas. Se você pergunta “tudo bem?”, arrisca ouvir de volta um “não é da sua conta”, para dizer o mínimo. Nas lojas, os vendedores são arrogantes, vai comprar ou não? Azar o seu. Próximo! Coisas de país rico demais, onde um cliente a mais ou a menos não faz a menor diferença.

Por isso fiquei fã de Lyonette, que me pergunta como eu vou, se quero hoje o mesmo de ontem, como foi meu dia _ essas coisas simples que a gente ainda faz aqui no Brasil. Por gentileza, e nada mais.


6 Comments:

At 10:03 PM, Blogger Luiz Antonio said...

Pois é, vivenciei isso em Paris, onde estive em maio, sem falar francês e arranhando um macarrônico inglês que na hora H travava de um jeito que nem good morning saía. Levei cada esporro de balconista, atendente de aeroporto que nem te conto.Mas tenho uma boa pra contar da gentileza brasileira: Eu voltando de Toulon, no aeroporto de Orly. 22PM. Deixei o celular (ao menos pensei ter deixado) no avião.Minha turma exausta foi pro hotel e eu fiquei no aeroporto para encarar o achados e perdidos _com todo esse domínio do idioma_pois bem encarei o balcão da air france, preenchendo ficha de objeto eztraviado e tudo: nada foi encontrado na aeronave.Sai dali fui pro balcão de informações do aeroporto para saber cmo ir até Madeleine _onde ficava o meu hotel_: sobrevivi e descobri que para Madeleine somente um ônibus até a estação INVALIDES,dali o metrô até Madeleine. Dois a zero (balcão da air france e de informações turisticas)pra mim, sózinho no meio dos franceses, onde eu parlava um françonhol misturado com inglês. O preço do ônibus era 11 euros e eu apenas com meu visa travel;Perguntei: Debi? (debito?) No! Eu sem grana e com um cartão sem achar um caixa de saque que o aceitasse. Tentei explicar, mas dessa vez....DESOLE...ou F....-SE!
E agora...PLIM! Liguei para o 0800 da Embratel, no Brasil. Expliquei pro atendente o que estava ocorrendo comigo. Ele pediu o numero 0800 (nacional) do meu visatravel. Ligou pro visa, explicou o meu apuro e me colocou na linha com o atendente do cartão, que pediu minha localização e identificou que no andar abaixo, do aeroporto, havia um caixa do "bank postale" e que ele aceitaria meu cartão , ali em Orly. Fui lá, saquei. Peguei o ônibus, desci em Invalide, tomei metrô e minutos depois estava no Hotel em Madeleine! Pelos franceses do aeroporto eu estava lá até agora! Mas o brasileiro da embratel safou a minha ponta. Essa camaradagem só mesmo no Brasil e esse pessoal "descolado" que se vira no meio dessas saias justas, só mesmo aqui também!!!modestia a parte. Paris, "ademã" que eu vou em frente..."de leve"! Quem tem boca vai a Roma e vai a França!
PS: meu celular estava no bolso do paletó, que descosturou e fez ele migrar para trás por dentro do forro,ou seja, foi pro hotel antes de mim, com meu amigos!!!!Garagalhada geral da turma com meu relato na manhã seguinte, durante o café no hotel, fomos nos encontrando , dando bom dia e indo se agrupar todos emm mesas próximas para conversar durante o café. Na segunda troca de lugar a garçonete visvelmente irritada: "Monsieur!!!....." (toma-lhe mais um "esporro!" mas essa eu conto numa outra hora!)

 
At 1:23 AM, Blogger pituco said...

joyce,

em terra de 'salve-se quem puder', lyonettes são salva vidas...curti o texto

abraçsonoros

 
At 9:02 AM, Blogger joyce said...

Pois é... Eu não tenho experiências ruins com Paris, não. Talvez devido ao meu francês bastante honesto, cortesia das freiras do Colégio São Paulo. Francês não tem paciência com quem não fala a língua deles, e afrancesa tudo, inclusive os nomes em inglês (eles têm bronca especial com inglês, melhor nem tentar). O pior que já me aconteceu lá foi eu tentar dar uma dica ao chofer de táxi e depois ter de admitir que ele estava certo - e ouvir de volta um "j'ai toujours raison, madame!"
Mas em Tokyo o pessoal é super gentil, né, Pituco? Pelo menos com quem não mora lá...

 
At 8:12 AM, Anonymous Sergio Santos said...

Joyce querida, no 11 de setembro, eu estava junto com Tutty, em Sampa. Ensaiávamos o Áfrico, e assim que começamos a dar forma a Ganga Zumbi, o dono do estúdio entrou na sala e disse que um avião acabava de bater no Empire State. Nós todos achamos que era uma piada, pelo tamanho do absurdo. Aos nos contar, o cara havia confundido os prédios, coisa que não fez o piloto do segundo avião, que vimos explodir na segunda torre do WTC. O ensaio acabou ali, e eu me lembro claramente do nó no estômago e da sensação de que nada seria como antes. Bjs.

 
At 2:05 PM, Blogger pituco said...

joyce,

no geral é uma gentileza formal...são educados e se esforçam em oferecer todo tipo de conforto...contudo intrasigentes quanto às regras...sempre brinco...quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha?...o japonês ou o manual?...o jeitinho brasileiro é bom pacas...

e caro luiz antonio, quase todos reclamam de paris...inclusive, os parisienses...assim me parece

abraçsons

 
At 10:42 AM, Blogger Luiz Antonio said...

gostaria de ter conhecido Paris ainda nos anos oitenta, antes da globalização. Acredito que seria mais justificavel esse comportamento "bairrista", pois hoje há muitos orientais e africanos em funções "menores" na rede de serviço. Imagino não devesse ser assim antes da globalização, o povo "mais xenofóbico do mundo", segundo dizem, ja está tão misturado que esse comportamento_talvez por isso_ fique mais acirrado. O regime de governo "obriga" a eles a sustentarem essa população estrangeira e isso esta me parecendo uma panela de pressão social em fogo lento.... estou enganado?

 

Postar um comentário

<< Home