meu país de bolso
Pois é, caiu na rede é peixe, e meu humilde post sobre a violencia no Rio (e por extensão, no Brasil todo) acabou saindo na Folha. Fiquei sabendo porque amigos me avisaram. Minha carreira de jornalista de fim-de-semana parece que vai de vento em popa... Os comentários que tenho recebido dos leitores deste blog (poucos, porém sinceros) têm sido interessantes: vai sim, não vai não (pra fora do país), todos muito bem fundamentados e todos com excelentes razões. No fundo, ir ou ficar é uma decisão que ainda não tomamos, mas em algum momento vamos ter de optar pelo que for o melhor, senão pra nós, pra nossa família.
Por exemplo, esta linda praia aí acima, onde passamos nossas férias regularmente, na Bahia: costumávamos freqüentá-la misturados com os locais, fazendo programas simples em lugares simplérrimos, bem do jeito que gostamos. Mas foi num desses lugares que passamos por uma situação de violencia que só imaginávamos acontecesse aqui pelo Sudeste. Resultado: férias agora, lá mesmo, só que nos lugares 'seguros', vale dizer, os caríssimos. É o preço da nossa tranqüilidade. E quem não puder pagar por isso? Não dá pra ser feliz sabendo que vivemos numa democracia onde uns são mais cidadãos do que outros.
Bye bye Brasil, a última ficha caiu; minha casa não é minha e nem é meu este lugar; inútil paisagem... vocês também sabem que a música brasileira tem resposta pra tudo, mais do que qualquer i-ching. Está tudo lá. Vou voltar, sei que ainda vou voltar para o meu lugar, de onde ainda nem saí, nem sequer sei se sairei. Mas meu lugar, meu Brasil, é um país de bolso, que eu carrego comigo na música que faço. Um país imaginário, portátil, feito de cores, sons e boas lembranças. Ele está lá, nos traços de Niemeyer, que vimos hoje na exposição do Paço Imperial. Está nas canções que os artistas plásticos retrataram em outra bela exposição na sala ao lado. Nos prédios antigos das ruas do centro do Rio, vazias neste domingão de sol. E isso, ninguém tasca, vai comigo aonde quer que eu vá.
O Brasil é a cultura do Brasil. É ela que nos faz quem somos. Nada pode ser mais importante do que isso. Nem um cão, nem um trovão, nem uma assombração, nem uma solidão. Não tenha medo não.
8 Comments:
Mas pudera! Tinha mais eh que sair na Folha mesmo! O Brasil me ofende...
Pois é, Joyce... o Brasil que você, eu e tantos outros amam parece que não existe mais. Sou carioca, mas moro no Rio Grande do Sul desde os 5 anos e uma de minhas maiores paixões no Rio é justamente o centro histórico, que conheço cada palmo, do Paço Imperial até se perder "pelas ruas de Santa Tereza, a rodar, a rodar...(B.Guedes)" , sonho em levar minha filha de 6 anos para uma caminhada dessas - sei que ela vai amar - mas ainda não tive coragem de pousar no Rio desde que ela nasceu, a família nos vê via msn. O Brasil ou o Rio de bolso, ás vezes acho mesmo que não existe mais, queremos de volta algo que nos foi roubado - ou será que isso nada mais é do que um tipo de erosão comum em todo processo evolutivo? Uma erosão moral e social, implacável mais devastadora e rápida do que ação dos ventos e mares sobre a terra...
Um Rio que só pode ser visitado num domingo de prédios fechados, ruas desertas, cheiro forte de fezes e urina nas paredes de arcos centenários e no becos dos mendigos...algo como uma viagem a um planeta desolado, pousamos nossa nave num cenário de ficção - NÃO MAIS - científica.
x;x;x
Beijos de outro que pensa em ir embora - não do Brasil, mas para uma colônia italiana aqui do interior onde minha filha no final de semana foi a uma festa do "vinho doce" na capela da Paz, e tava lá de calça lee, um paletózinho rosa e chinelinho de dedos, feliz em meio aos locais brincado no pátio da capela até a 1/2 noite,esperando o final do horário de verão, para de novo ser somente 11 horas, e continuar ali entre cantorias, cachorros e gente que ainda dá “boa noite” e te convida para uma partida de "bocha" e de quebra ainda te ensina a "parlar italian"...mas, não me engano, sei que é questão de tempo - violência anda a cavalo - mas acredito e tenho muita fé de que a carência daquele lugar ainda é de algumas décadas...
Pois eh, Joyce. Essa eh a cultura brasileira que nos temos que defender. Faz a sua parte quem entende e divide esse nosso lado com orgulho.
Problemas no Brasil - temos muitos, sim- sao estruturais, como resolve-los? Nao tenho a minima ideia mas sem duvida passa por uma reforma seria do sistema educacional - a ignorancia reinante nos dah uma democracia de fachada, mas isso eh a minha opiniao e discussao longa, nao cabe no post.
Na faculdade fui cicerone de varios grupos de gringos que vinham conhecer a "realidade" das favelas. Assim pela manha subiamos os morros e a tarde faziamos "city tour" pelo "asfalto". Procurava explicar e mostrar a cidade ligando os dois lados e explicando a historia da formacao do Rio de Janeiro - que afinal de contas, eh a Historia do Brasil. Tenho certeza que aqueles olhos de "exploradores do mundo exotico" se transformavam depois de conhecer melhor nossa Historia.
Li o que você escreveu há poucos e realmente não pensei em comentar nada por que nem sabia o que comentar.
Fui assistir a novela Páginas da vida e no final onde tem aqueles depoimentos ouvi o depoimento do namorado de uma modelo que foi incendiada num assalto a ônibus e que acabou sobrevivendo.
O que mais me chamou atenção foi quando ele disse que depois de tudo esperava ter filhos com ela e que achava também que o Brasil no futuro iria ser um país mais justo.
A esperança dele me chamou a atenção!!!
O otimismo dele me chamou a atenção!!!
Pra frente Brasil.
Oi Joyce!
Se você for embora do Brasil eu vou vicar muito triste.
Mas isso é mais uma prova do que diz aquela música: "O Brasil não merece o Brasil, o Brasil estão matando o Brasil".
Se você for eu entenderei, mas o Marcos Valle que fez a música Ao amigo Tom, vai ter que fazer uma música chamada A amiga Joyce.
Eu também tenho saudades do Brasil, o Brasil de Tom Jobim, de Villa Lobos, de Dorival Caymmi, de João Gilberto, da Joyce, mas infelizmente esse Brasil não volta mais.
Um beijo!
Pois é, Joyce, como é triste pensar nesse Brasil... Sobre ir para fora, acredito que no mundo da América do Norte a violência seja travestida de outras formas. Não é a que vemos hoje nas ruas daqui, a proveniente do querer ter antes do querer ser, a da perda total dos valores morais, do respeito, da busca pelos objetivos nobres. Por lá acredito que exista a violência que vem da falta de amor. Fico imaginando se vivêssemos em um país onde seu vizinho respeita o limite do seu quintal, mas não aceita que você beije alguém na boca descaradamente, ou que você abrace e aperte crianças sem que você possa ser mal interpretado ou possa virar uma reclamação caracterizada como o tal PDA: public display of afection. Não é à toa que por vezes vemos nos jornais essas manifestações de meninos que matam pessoas em escolas, ou mesmo os tais serial killers, enfim. Talvez por lá exista a falta da mais pura democracia, a aceitação do outro, o afeto, a unanimidade brasileira do sorriso, o que nós ainda temos e que não vem da lei, mas do coração. Mas, no final, a questão sobre a violência acaba sendo a mesma, aqui ou lá: quanto e como o governo e as pessoas vêem o outro e o quanto isso interfere na nossa vida...
Amor e sucesso!
Joyce.
Somos aquilo que conseguimos criar. São assim as pessoas e também assim são as nações, povoadas por anônimos que criam. Os anônimos criam. Criam do lavrador ao engenheiro, do cirurgião ao lixeiro. Toda dona de casa cria, dia após dia: a sobrevivência é um ato criativo. É isso que nos molda, nos distingue, nos alegra. E nossa terra é uma operação exponencial dessa força criativa. Ela é nossa cultura. Ela foi capaz de criar condições pra alimentar o espírito criador de um Villa, de um Niemeyer, de um Rosa, de um Pelé, de um Vinicius. Alimenta o seu. E alimenta o feirante que hoje cedo me vendeu uma melancia e um verso improvisado, uma alegria só. Disso é feita a nossa terra. Mas ela, contraditória como as pessoas, é capaz também de criar todas as condições pra existência do contrário. Imatura que ainda é a nossa terra, gera tempos em que esse contrário fala mais alto, como agora. Mas não foi assim também na ditadura? E não vencemos? Tenho a sensação de que nosso país precisa muito da gente. Agora. Precisa da nossa criação, de cada um de nós. Posso parecer ingênuo, e talvez seja, mas tenho a sensação de que hoje, cada canção, cada nota, é necessária. Cada um que incorporar no seu dia a dia a parte que lhe cabe para remar contra essa maré vai estar pesando essa balança pro lado que acreditamos. Ainda creio em uma terra que, caramba, nós merecemos ter. Ainda que não pra nós, pra nossos filhos e netos.
Bj
Sérgio
PS: Vai não, viu? Fica por aí.
Tenho saudades também de um Rio que não sei se conheço mais. Estou nos USA há seis anos, e ainda não me conformo com esse frio de fazer água nos olhos. Mas é melhor chorar de frio do que por motivos outros, cada vez que leio as notícias do Brasil e do Rio. Aqui posso ouvir boa música brasileira no rádio. Eles respeitam os nossos bons artistas , comemoram aniversários com programas especiais, um luxo! No aniversário do Tom, foi uma beleza! Por falar nisso, acabei de ouvir ainda há pouco uma gravação sua com o Jovino dos Santos(Nanã). Muito "ótema"! Boa noite!
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