sábado, março 15, 2008

parceiros e parcerias

Acabo de ler matéria no Globo falando de uma suposta modernidade: as parcerias virtuais. Nem tão muderno assim, devo dizer: tudo depende do parceiro ou parceira com quem se esteja trabalhando. Eu, que sou pessoa gregária, adoro fazer parcerias. Mas não sou muito fã do sistema Tom & Vinicius de composição _ os dois compondo letra e música juntos, cara a cara, muitas vezes com platéia de amigos, esposas e/ou namoradas, admiradores, discípulos, enfim, um monte de gente olhando, participando e `as vezes "atrapalhando a criação", como eu contei em minha música "Na Casa do Villa". Prefiro o silencio e a intimidade numa hora dessas, sem ninguém por perto, embora já tenha feito músicas cercada pelo mesmo monte de gente quando foi necessário. Por isso mesmo, perdi a chance de me tornar parceira do Vinicius quando ele me convidou. Fiquei encabulada, nos meus vinte e poucos anos, de compor na frente dele e da torcida do Flamengo. Não muito tempo depois, foi-se o Vinicius, e a oportunidade se perdeu.

(Impossível esquecer do Tom fazendo "Águas de Março' e mostrando a letra ainda no rascunho para os amigos, em suas várias versões _ e apontando para minha barriga de grávida (de minha filha Ana) e dizendo "é a promessa de vida no teu coração". E como esquecer a noite em Petrópolis quando Chico e Francis começavam a compor 'Atrás da Porta', e Chico, empolgado com o 'e me arrastei e te arranhei, e me agarrei nos teus cabelos, nos teus pêlos...', arranhou o peito de Francis até tirar sangue? Quem viu, viu...)

Gosto tanto de fazer parcerias que isso chega a impedir minha parceria principal, que deveria ser a minha comigo mesma, e que compõe a maior parte da minha obra. No momento, minhas produções-solo estão encostadas, `a espera de que eu tenha tempo para elas, enquanto, de todos os lados, meus atuais parceiros entopem minha caixa-postal com músicas lindas, que eu não posso deixar de completar. E olha a parceria virtual aí, gente!

O mp-3 foi uma invenção abençoada para compositores tímidos como eu. Em vez de ficar com o parceiro do lado, assistindo a todas as suas tentativas e erros (pois é assim que se faz), a gente tem tempo e calma para ir tentando, mexendo, mudando daqui e dali, até acertar. Vejam bem, falo de letra, não de música. Música é outro barato, a conexão é direta com os deuses, o canal está sempre aberto e o violão nunca decepciona: é pegar e tocar, e já sai alguma coisa que preste. Mas com as palavras é diferente: a responsabilidade pesa, `as vezes uma vírgula no lugar errado muda tudo, e eu acabo levando um tempão pra dar o texto por encerrado antes de apresentar para o parceiro.

Mas cada um é cada um: tem parceiro que gosta de compor junto, tem os que preferem mandar a música ou a letra, tem os que não sabem nem ligar computador, como Dori Caymmi e João Donato, tem os que usam a tecnologia do mp3 caseiro com desembaraço, como Menescal, Carlos Lyra e Zé Renato, tem quem passe a letra por fax, como Paulo César Pinheiro, tem quem grave em estúdio, como Leila Pinheiro e Francis Hime, tem de tudo um pouco. E olha que estou falando só das parcerias mais recentes...

Donato, nos últimos tempos, descobriu a pólvora: faz a primeira parte da música e entrega para a parceira (que sou eu, no caso) terminar a melodia e fazer a letra. Espertinho. Já vi que ele está fazendo assim com outros parceiros também, mas não sei se tem dado certo. Comigo deu, e eu ainda capricho nas segundas partes para que fiquem com a cara dele, como foi em 'E Vamos Lá', que fizemos num camarim do Blue Note Fukuoka, no Japão. Faz algum tempo, fui com o Tutty visitar a gostosa casa de Donato e Ivone na Urca, e saí de lá com três novas parcerias _ melhor dizendo, duas e meia, pois uma ficou ainda por completar. Ele gosta de trabalhar junto, no sistema cara a cara. Eu levo a música pronta pra casa e trabalho na letra depois. De memória, mas tem funcionado direitinho.

Bom mesmo é quando a parceria, virtual ou não, dá certo, e depois aparece lida e relida na voz de outra pessoa. A música então ganha vida própria e sai pelo mundo. Mas aí já estamos falando dos intérpretes, que é um outro capítulo.

7 Comments:

At 2:09 PM, Anonymous Anônimo said...

Apesar de nos brindar com boa musica, ainda nos diz como funciona as coisas, nao precisa mais nada.

 
At 11:48 PM, Blogger pituco said...

Joyce,
no meu caso,por questões geográficas mesmo,as parcerias virtuais são abençoadas...

ou com amigos de outrora,bem como os feitos e cultivados pela net(ainda não os conheço pessoalmente..rs!)

agradeço,sempre,ser contemporâneo dessas facilidades todas...
imagine que,há duas décadas atrás,uma carta pra atravessar o planeta levava de 7 a 10 dias...um telefonema,15 dólares por minuto(era tempo de dizer: alô e saudade...piiiiii).

por aqui, encabulamento e vergonha acabam indo por água abaixo...é possível manifestar nossos sentimentos,sem ter de mostrar o rosto corado com o sorriso amarelo...ou evitar um contacto com quem admiramos,por mero acanhamento!

abraçsonoros
namaste

 
At 11:34 PM, Blogger Gustavo :: ovatsuG said...

Queria eu poder ser seu parceiro, embora assim considere-me nas minhas audições de seus discos e livres interpretações no chuveiro (rs). A cada dia me encanto mais com seu trabalho. Preciso ver um show seu, que não seja o DVD. Beijos!

 
At 8:59 PM, Blogger Bernardo Barroso Neto said...

Essa pra mim é nova. Não sabia dessa quase parceria com o Vinícius, seria ótimo.
Já estou doido pra ouvir as músicas inéditas que você fez com o Donato.
A começar por No fundo do mar, que você tocou nos 50 anos da Bossa Nova.
Já estou ansioso também em saber quabdo vai chegar o seu DVD novo.
Muitas felicidades!
Beijos!

 
At 9:49 AM, Anonymous Anônimo said...

olá, Joyce!
Você está usando a La Bella 413P?
é tensão alta? o que vc me diz dessas cordas?
já experimentou a La Bella 2001?
Beijos de seu fã Márcio Cardoso

 
At 6:00 PM, Blogger Evana R. said...

Oi, Joyce! Descobri seu blog há pouco tempo, mas já li praticamente todos os posts, todos ótimos!!
Esse teu post me lembrou de quando, há não muito tempo atrás, eu e mais duas amigas nos juntávamos pra tocar. Esperávamos meus pais saírem de casa e aí começava o festival de tentativas. No final das contas, não deu muito certo, enfim...
Peninha que não aconteceu a sua parceria com o Vinicius, mas... Que venham novas maravilhosas composições (solo, em dupla...) e muito sucesso! Beijos

 
At 11:40 AM, Anonymous Anônimo said...

Joyce,
Suas histórias são sempre deliciosas de ler!!!

 

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