amigos reais e virtuais
Há uns meses atrás li na revista Newsweek, na coluna da última página, uma reflexão interessante de um jornalista cujo nome não lembro. O título era "You Are Not My Friend". O colunista se referia a todos esses portais que existem hoje em dia, sites de relacionamento, Orkut, Twitter, Facebook e tantos outros. E questionava o nome "amigo" dado aos co-participantes da rede. Como assim, perguntava ele, como assim, somos amigos, se nunca sentamos juntos para comer, por exemplo? Se nunca nos olhamos de frente, nem sabemos nada um do outro, além daquilo que queremos expor publicamente?
É uma boa questão para se discutir. E delicada, também. Já me aconteceu recentemente, na tour européia, de receber no camarim uma adorável família de músicos que viajara longa distancia para assistir ao show. Quando eles se identificaram, disseram: "você sabe quem somos, somos seus amigos no MySpace". E eu, sem graça, tive de explicar que nunca, ou praticamente nunca, acesso meu portal no MySpace, que foi criado em meu nome pela gravadora de Londres. Lá eu tenho mais de 1.800 amigos que nunca vi e com quem jamais me comuniquei. Eu não tenho 1.800 amigos na vida real. E olha que conheço muita gente. Mas amigo é outra coisa. E são relativamente poucos.
Também nunca na vida entrei no Orkut, embora saiba que existem algumas comunidades sobre mim ali. E também não respondi aos apelos de amigos _ reais _ que quiseram me incluir em suas redes de relacionamento no Facebook, Hi-5 e outras. Liguem pra mim, pôxa. Me mandem um email direto, quando e se tiverem tempo. Porque ainda tem essa questão do tempo. Essa coisa de relacionamento via internet, como diz uma canção da minha parceira Ana Terra, "é muito bom pra quem não tem que trabalhar". Em que horários uma pessoa poderia acessar essas redes todas? Tem que escolher uma, pelo menos? Então, no meu caso, já que gosto de escrever, escolhi o blog, e está de bom tamanho.
Através do blog, fico conhecendo por alto algumas pessoas que fazem comentários pertinentes e impertinentes sobre as besteiras que escrevo, todos bem-vindos. Sei que Luiz Antonio mora em Porto Alegre, tem duas filhas pequenas e é casado com uma professora. Sei que JoFlavio, jazzófilo como eu, mora em Londrina e tem um programa de rádio sobre o assunto. Sei que Pituco rala em Tóquio, na dura, mas talvez divertida vida de músico da noite. Que Bernardo é muito jovem e parece bastante precoce. Que Angela e Vicky, ambas com respeitável formação intelectual, já encararam subempregos como imigrantes, nos Estados Unidos e na Inglaterra. E por aí vamos. Sei uma coisinha aqui, outra ali, pelo que percebo ou pelo que eles contam. Isso não me dá o direito de entrar na intimidade deles, nem eles na minha. Nos gostamos virtualmente. Mas não somos exatamente "amigos". Até porque de repente eu poderia descobrir que nada é o que parece, e na verdade Pituco tem duas filhas pequenas, Luiz Antonio tem um programa de jazz e JoFlavio é músico em Tóquio. Ou que um deles é mulher, vai saber? Na internet pode tudo.
Mas gosto de pensar que somos todos pessoas refletindo juntas sobre os assuntos que boto aqui na mesa. E principalmente, que não se trata de fãs. Sempre me incomodou essa relação artista-fã, e por isso mesmo sempre recusei a idéia de ter um fã-clube dedicado a mim _ o fã-clube é uma instituição que, caso vocês não saibam, quase sempre é monitorada e estimulada pelas produções e/ou gravadoras dos artistas (excetuando-se, talvez, aqueles tradicionais do século passado, tipo Marlene e Emilinha. Talvez.) É o famoso culto à personalidade, que se me incomodava em Mao-Tsé-Tung e Stalin, incomoda ainda mais se for comigo...
Se alguém gosta da minha música, agradeço e fico feliz, pois é para isso que ela existe. Já a minha pessoa, é outra coisa. Somos todos humanos, e o que nos irmana é justamente isso, nossas fraquezas, nossos problemas, nossas solidões. A vida de um artista não tem esse glamour todo que as pessoas pensam.
Continua num próximo post, mais adiante.
9 Comments:
Verdade, Joyce.
Acho que é a primeira vez que comento algo aqui no teu blog, apesar de já acompanhá-lo faz tempo (e ter linkado teu blog no meu, hehe), porque não gosto dessa coisa de ficar babando, idolatrando artista (o que certamente faria, a revelia da minha razão, se comentasse em outro post...rsrs).
Há algum tempo acompanhava um blog sobre política, o Quinta Emenda, escrito por Juvêncio Arruda. Juva, como era conhecido, ficou famoso aqui no Pará (minha terrinha) por sua coragem e suas denúncias, além do bom humor. Muitos só o conheciam pelo blog, pela internet.
Bem, Juva morreu repentinamente aos 54 há uma semana atrás. Sua morte causou comoção entre os blogueiros, mesmo os que nunca tiveram contato físico com ele (como eu, que escrevi um artigo sobre ele no meu blog).
Eu, que o conhecia apenas pela rede e admirava seu trabalho, jamais irei sentir a mesma dor de uma pessoa que partilhou por anos a amizade do Juva.
Achei interessante encontrar um texto falando sobre amizade virtual justo nesse momento. Em uma ocasião como essa dá pra sentir o que é tátil e o que é imagético. Temos, sim, que ter essa noção.
Além disso, quero dizer que admiro muito teu trabalho. A primeira música que ouvi da Joyce (porque agora é Joyce Moreno) foi Clareana, bem pequeno, tinhas uns 5 anos, acho. Desde então só tenho ouvido mais e mais teu trabalho, de O Chinês e a Bicicleta até Samba da Silvia, de Barraco no Metrô à Rio-Bahia.
Pra mim, uma das raras artistas da música que toca, canta e compõe muito bem.
Admiro teu jeito de compor, num meio dominado pelos homens (acho que depois de ti... só a Fátima Guedes....hehe)
Abraço paraense!
(quando vens pra Belém?)
joyce,
nesses sites de relacionamento, há muita gente bacanuda...contribuições,auxílios...essas coisas.
há poucos minutos atrás, teclava com um 'amigo virtual' que enviou-me o áudio da 'mara e cota'(eu não existo sem você)rs...enquanto eu repassava a ele as cifras do joão em 'cordeiro de nanã'.
acredito que essa troca de informações, na internet livre, seja um grande avanço....e uma amizade, diferente da que nos acostumamos na rotina real.
quanto a ser fã...é involuntário...rs
concordo que sem o glamour imposto pela mídia...sou fã do miles davis, embora sabia sobre os podres com hermeto, por exemplo.
ouço strawinsky, mesmo ciente de sua simpatia pelo nazismo.
aliás,
li um comentário piramidal num blog de jazz...'entre o homem e o mito – não relute a preferir o segundo'.
é isso aí,
abraçsons desse lado do planeta
ps...sábado devo ir à entrevista do joão donato(nem sabia que estava por aqui)...pensei que viesse apenas em setembro pra temporada junto contigo, no blue note(já me programando pra assistir)
Oi Joyce!
Concordo com você. Esse negócio de ter vários sites de relacionamentos é complicado mesmo, a pessoa acaba ficando perdida. rs
Também acho que esse blog é uma forma de discutir os assuntos que você nos coloca.
Parabéns pelo blog e pelo disco novo!
renato,
comentário emocionante...
tenho certeza que tanto a joyce artista, quanto a pessoa, tenham se emocionado também.
valeô, rapaz
abraçsons
namaste
Oi Joyce!
Eu sou mais um comentarista caçula (só 16 anos) rs. E concordo com o que o Renato postou acima.
A internet por um certo ponto também me auxiliou muito com o meu gosto musical; aliás, conheci o seu trabalho por meio da internet.
E como ainda curso o Ensino Médio, muitas vezes é difícil compartilhar o meu gosto com as pessoas da minha idade, por muitas vezes já riram da minha cara pelo meu gosto, isso não me atrapalha, mas o que vem ao caso no momento é que com o auxílio da internet, orkut e afins eu tive a oportunidade de conhecer novos horizontes e pessoas com quem posso compartilhar minhas ideias, exemplo claro é uma comunidade que existe no orkut conhecida como "MPB Jogos", onde as pessoas interagem entre si com jogos e brincadeiras relacionados a música brasileira. Nessa comunidade irei fazer 2 anos de participação ativa e posso dizer que lá eu consegui fazer amigos de verdade, com quem converso sobre tudo, muitos membros já se encontraram e passam a ser amigos reais também, mas acho que uma amizade não fica bloqueada à tela do monitor. Talvez pelo mesmo motivo já citado, também nasci na Era Digital.
Talvez, a certo ponto isso fica muito restrito de pessoa para pessoa, o que causa desentendimentos entre ambas.
Mas eu sou grato por tudo que passei a descobrir com a internet, quando ouvi Clareana foi um momento mágico, porque achei de uma genialidade incrível e passei a virar admirador do seu trabalho.
Mas, adoro ler suas postagens e comentá-las e poder dizer com orgulho para todos que o primeiro show que assisti e no momento, o único ainda, foi da grande Joyce!
Essa história de fã-clube é mesmo uma roubada pra artista. além desse culto à personalidade, imagino que deve fortalecer ainda mais os egos, né? É tão melhor e mais produtivo um espaço como esse que você tem para dividir conosco - os admiradores de arte - as suas coisas, viagens, ideias...
Quanto as redes de relacionamento, é uma outra roubada... já vi cada coisa nesses sites que as vezes penso em fugir. Mas tudo tem seu lado bom. No orkut, por exemplo, é onde fico sabendo de boa parte dos shows que acontecem na minha cidade, já que divulgação é sempre o grande grande problema por aqui. Só é uma pena que nem todo mundo sabe usar esse tipo de espaço.
Ah, ganhei o "slow Music", e nem vou repetir o que todo mundo já deve ter te falado... mas preciso dizer um "obrigado" especial pela versão de "Medo de amar", minha música favorita do Vínicius... ficou muito melhor do que no meu imaginário! espero que você faça shows desse cd, e que eu consiga ir! haha
Eu acho que não tem mesmo como o artista responder a cada pessoa que entra no blog e coloca algum comentário, e eu pelo menos nem espero isso dos vários blogs que visito, incluindo esse. Apareço aqui pra saber o que ta rolando na vida musical da Joyce e até mesmo ler os ótimos textos postados aqui. Não vejo problema em ser fã do trabalho de alguém, mas o fã tem que respeitar o limite do artista. Eu faço isso, quando vou ao show por exemplo e estou com meu cd em mãos e o cantor (a) pode receber pra dar um autografo acho super bacana essa aproximação naquele momento, e muitos fãs esperam isso, mas por outro lado se não for possível tudo bem também. Não acho que o artista tem essa obrigação, mas de vez em quando manter contato (pessoalmente pós shows, ou quando do lançamento de um cd por exemplo) com o fã é bacana.
Amanhã acho que compro finalmente meu cd " Slow Music" - aqui em SP estava meio difícil encontrar nas lojas, mas já descobri uma que tem. Uhuuu!!!
Joyce tenho certeza que esse CD é mais um super trabalho; se puder adoraria assisti-la novamente aqui em SP agora com esse novo trabalho.
Que honra me ver citada aqui!!!! :D
Faz muito bem em nao ser inscrita em redes de relacionamento. Sao vazias, e podem se tornar um vicio sem proposito algum. Tem gente que passa mais tempo no facebook ou no orkut do que propriamente trabalhando, depois reclamam das horas extras para dar conta do trabalho.
Eu participo de algumas por conta do meu blog, e por estar vivendo uma forcada vida de princesa, que nao me agrada em nada (long story, not worth mentioning). Entao preciso preencher meu tempo e escolhi escrever. Mesmo assim ainda acho que lucraria mais lendo. Quando a vida voltar ao normal, com certeza nao terei mais tempo para essas coisas.
Ainda bem que temos voce compondo para nos!
É paradoxal... entrei nesses sites de "relacionamento" achando que iria reencontrar e conhecer pessoas, e manter o contato com os amigos que por algum motivo estavam distantes. Mas é ilusório, pois você reencontra, conhece, comunica-se eventualmente com quem está longe... e se acomoda por poder fazer isso sentadinha na sua casa, em frente à maquina. Quer dizer, você pensa que isso aproxima as pessoas, mas na verdade não "arreda o pé" de casa para ouvir as vozes, olhar os olhos, apertar as mãos. É uma aproximação à distância, vai entender... Por isso não abro mão do velho "clube da Luluzinha" todo mês: a gente fala besteira, engorda uns 5kg, troca música, cinema, segredo... e cada uma revisita a si mesma! Quanto a ser fã: dizem que os amigos são para todas as horas... então sua música, Joyce, é uma das minhas mais fiéis amigas, e tá de bom tamanho, afinal "que bom, que bem que faz o som feliz da paz", e escutá-lo deve ser muito difícil para o artista constantemente invadido e assediado...
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