sábado, julho 02, 2011

os anos 1980


O pessoal costuma chamar este período de "década perdida". Mas era ali que precisaria terminar a história que estamos contando na nossa série 'No Compasso da História'. Bem num tempo difícil, onde a música se dividiu entre roqueiros de várias tendências ocupando o mainstream, músicos independentes chegando no pedaço e surpreendendo o mercado, vanguardistas brotando no teatro Lira Paulistana e os emepebistas mais ortodoxos lutando para não cair no buraco negro da censura. Um tempo estranho e de muita luta, com o atentado do Riocentro, o país pedindo eleições diretas para presidente e uma inflação galopante, que os mais novos não fazem ideia do que tenha sido. Até que chegasse a tão sonhada redemocratização.

Para um programa de tantas diferenças musicais, o convidado teria de ser alguém que pudesse transitar com desembaraço por todas estas 'aldeias', cada uma com sua complexidade particular. Convidei Paulinho Moska, um roqueiro emepebista (ou um emepebista roqueiro) para me acompanhar nesta viagem. E esse convite se provou de um acerto sensacional. Na foto acima, estamos cantando/falando a maravilhosa "Bem Baixinho", hit do Grupo Rumo (um dos grupos emblemáticos da chamada vanguarda paulistana), com Antonia Adnet tranquilamente dando conta do difícil desenho de violão criado pelo autor Luiz Tatit.


Como diria o grande Wilson das Neves, "ô sorte!" Pois Moska conhecia este repertório de trás para diante, e realizou com brilho a tarefa de cantar músicas marcantes do rock brasileiro da época, como 'Que País É Esse?' e 'Ideologia'. Mas também foi um grande companheiro de viagem em coisas tão diversas como a 'Toada' (hit do Boca Livre, primeiro grupo independente a vender mais de 100 mil discos), 'Cartomante' (de Ivan Lins e Vitor Martins, bela e sombria), o megahit 'Brasil' ('mostra a tua cara' - que acabou em samba) e, para encerrar o programa e a série, 'E Vamos à Luta', do querido Gonzaguinha (aquela que diz 'eu acredito é na rapaziada' - pois ao fim e ao cabo, quem faz a História somos nós, o povo brasileiro)

Foi divertido também reler algumas canções pop com um outro olhar e uma outra levada, como estamos fazendo na foto acima com 'Comida', dos Titãs, levada por nossos três violões naquela onda que o grande Moacir Santos inventou e batizou de 'mojo'. E como também fizemos com 'Inútil' ('a gente somos inútil'), trazendo um suingue meio jazzista para essa canção de DNA mais punk. Minha 'Feminina' também esteve lá, para o momento em que se fala do grande boom de compositoras daquele momento, do qual fiz parte; no momento em que se falou em Tancredo Neves, tivemos o 'Clube de Esquina'; e para os créditos finais, 'Vai Passar', de Chico e Francis, claro. Pois o sanatório geral está aí até hoje.

As gravações ainda não terminaram, pois ainda nos falta gravar dois programas - o que trata do Império e o da República. Mas já deu pra sentir as primeiras saudades deste trabalho que me envolveu por mais de um ano, e que me tem juntado a uma equipe supimpa.

13 Comments:

At 4:08 AM, Blogger pituco said...

joyce,

faço parte dessa 'década perdida'...da dita vanguarda paulistana (termo criado pelo grande incentivador da galera dita independente...maurício kubrusly)...

muita informação acontecendo em sampa àquela época...começo de abertura...anistia...a gente querendo um discurso menos carrancudo e metafórico...diretas já...ou como o paulo caruso dizia...diretas, já já!

conheço pouco o trabalho de paulinho moska, mas conheço muito o da galera do grupo rumo...bacana a inclusão de 'bem baixinho'...curioso que, ainda nos anos oitenta, assisti a apresentação da clara sandroni e adriana calcanhoto(nada conhecida à época), em sampa, e no setlist delas estava 'olha joaquim' do rumo tb...

bom, é isso aí...
abraçsonoros desse lado de cá...e preparem-se pro calor

 
At 1:01 PM, Blogger lurian said...

Joyce, não tem a ver com o post, mas tem a ver contigo: Estou passando para parabenizá-la pela linda gravação de "Banana" no disco Red hot + Rio 2. O que me impressiona é como você, em meio àquela garotada fez uma gravação moderníssima e pra lá de antenada. Sonoridade de 'fina estampa'!!! Não canso de ouvir aquela beleza. Que venham mais sounds com aquela vibe que tem sua rubrica e que ao mesmo tempo dialogam tão bem com os sons "contemporâneos".

Odimar Feitosa.
Fortaleza-Ce

 
At 1:42 PM, Blogger joyce said...

Oi Pituco, 'Olha Joaquim' na verdade se chama 'Rude Franqueza' e foi composta pelo Carlos Sandroni, irmão da Clara. Eles curtiam muito aquela estética do canto falado, e o primeiro disco da Clara é cheio dessas coisas, como outra genial do Carlos, 'Pão Doce', e a 'Ladeira da Memória' (essa sim, do Rumo)

Ainda não ouvi o resultado final do Red, Hot +Rio 2, mas tem 2 faixas minhas (uma cantada por mim com o Madlib, o 'Banana', e outra uma versão louquíssima do 'Mistérios', feita por Om''Ma Keith)

 
At 5:01 AM, Blogger pituco said...

joyce,

desculpe a trocada de bolas...obrigado pelo reparo...

imperdoável com o carlos e a clara, mesmo porque tenho esse lp, aí no brasil...e ouvi bastante...

ainda no começo dos anos oitenta, a clarinha abria uma temporada da gente, aí no teatro ipanema...sempre fomos fãzão do trabalho dela e do carlos...

bom, agora ficou a dúvida quanto a adriana calcanhoto...lembro-me dela sozinha, violão e voz...show intimista no teatro do colégio caetano de campos (pça da república em sampa)...pôxa, faz tanto tempo...talvez seja sim, 'rude franqueza'...

é isso aí..

 
At 3:48 PM, Anonymous Baptistão said...

Eu não curtia muito o Paulinho Moska. Hoje digo que gosto cada vez mais dele. Além das canções e da sua qualidade como músico, ele me passa a impressão de ser um grande gente fina, do tipo agregador. Acho o programa Zoombido um grande achado, e é admirável a preocupação dele de aprender cada música que toca em dueto com os convidados - ele quase nunca lê o que toca e canta. Você participou do programa dele e pode dizer. Aliás, Joyce, como alguém consegue ver este seu programa em São Paulo, se é que consegue?

 
At 4:13 PM, Blogger joyce said...

Oi Baptistão, nosso programa está em fase de negociação com uma emissora aí de SP. Aviso assim que souber. E sim, o Paulinho realmente estuda cada música que rola no programa dele, chega com o dever de casa feito - e soma muitíssimo na hora de fazer um programa como este meu, onde o convidado precisa se afinizar com coisas tão diferentes. Foi ótimo trabalhar com ele.

 
At 2:37 PM, Blogger Luiz Antonio said...

Me detenho na "década perdida".Apenas uma forma de designar um tempo "esquisito", mas para mim, que vivi a adolescência na década de oitenta, não gosto do termo. Víamos os movimentos, a volta de quem tinha "saído", sem nem sequer imaginarmos o porquê tinham "ido". Algumas letras de música não faziam sentido para nós: " a volta do irmão do Henfil, o tal rabo de foguete" ou "meu caro amigo eu bem queria lhe escrever, mas o correio andou arisco..."
Adultos que sabiam do que se tratava não nos abriam muito a questão. Resultado, ao menos comigo: acredito somos parte de uma grande geração questionadora, não de ideais políticos mas do "por quê" de muitas coisas. E esse "por quê" se aplicou a questão da mulher na sociedade, aos hábitos de nossos pais, a sexualidade a forma como fomos criados e ...bem mais tarde a política.
Costumo dizer que , quando crianças, na decada de setenta, essa geração de adolescentes dos anos oitenta, enquanto marchavam, inocentes na semana da Pátria, cantando “Eu te amo meu Brasil”, muitos outros estavam sendo procurados por seus familiares, por terem desaparecido estranhamente. Naquela época, não sabíamos disso. Somos de uma geração que teve ocultado parte de sua história, mas que ainda assim viveu a parte que lhe coube dela.

Conquistamos a liberdade que nem sequer sabíamos termos perdido. Porém, ao longo do tempo, fomos perdendo limites, nosso respeito ao coletivo, senso de cidadania e outras características, que esperávam, todos nosso antecessores, fossem ser realçadas com a vivência democrática.
E, apesar de termos vivenciado isso durante nos anos de chumbo, é difícil não sentir saudades, tanto daquele tempo "perdido", segundo alguns quanto da produção musical brasileira que teve, sem dúvidas, um grande avanço naquele tempo. Fi lá que te conheci, conheci Fatima Guedes, Miltom e o proprio Jobim.
Se a década foi perdida, para muitos de nós foi justamente aí que nos "encontramos". Salve os anos oitenta!

 
At 3:52 PM, Blogger joyce said...

Muito interessante seu ponto, Luiz Antonio. Assim que tiver um tempinho vou prosseguir aqui com este assunto. Mas desde já afirmo sem medo que a década foi perdida sim - na economia, por exemplo, e na solução das questões políticas, ainda atreladas a uma ditadura que já caíra de podre. As conquistas de hoje começam a partir da década de 1990, e principalmente com a estabilização da moeda. Isso muda tudo.

 
At 3:53 PM, Blogger joyce said...

Ou seja, não foi a geração que esteve perdida. Foi o país como um todo.

 
At 5:04 PM, Blogger Luiz Antonio said...

Legal!
Aliás, suas filhas devem fazer parte dessa turma que adolesceu ou entrou nos "vinte anos" mais ou menos por ali...embora tenha vivido com uma turma muito esclarecida, engajada, e envolvida com movimentos de vanguarda nas artes, musica... Meus colegas, que nao acompanharam o Brasil, migraram para o rock progressivo Pink Floyd e outros. Quem ficou no Brasil encontrou um universo novo na "MPB" , que talvez traduzisse esse contexto dos anos 80. Já eramos estranhos por gostar de música brasileira, enquanto o estrangeiro invadia as rádios. Essa "estranheza" de ser Brasileiro e gostar de Brasil dentro do Brasil, na música, no cinema (sofridinho) e no teatro talvez tenha contribuido para nossas viagens existenciais, leituras, filosofias e questionamentos, pois passou também por uma questão de se aceitar ser "diferente" em meio a uma adolescencia e juventude de forte influência estrangeira no que diz respeito a cultura (livro, música, cinema) Legal. A geração realmente não se perdeu, como disseste, mas fomos atras de respostas para uma mudança que ocorria a olhos vistos e ainda não sabíamos bem o porque daquilo, mas me parecia estar terminando um ciclo de proteção (seria alienação?)e agora cada um por si, brigas, greves, gritos, protestos contra algo que havia acabado, mas que a gente nem sequer tinha se dado conta que existira....era mesmo algo de se pensar, não é mesmo? De certa forma um "repúdio" ao Brasil, pelo do que ele significou, para muitos que viveram a ditadura, para nossos pais, mas pra quem só soube disso mais tarde....haja cabeça pra pensar e entender! Que papo cabeça, hein!

 
At 9:35 PM, Blogger Luiz Antonio said...

ha,há ERRO CRONOLÓGICO...E TE COLOQUEI UNS DEZ A MAIS NA TUA ESTRADA! SE CLARA E ANA ERAM PEQUENAS EM 80, COM CERTEZA NOS ANOS OITENTA VIVERAM A INFÂNCIA! POR TRATAR-SE DE UMA MULHER, MESMO DESGRILADA COM ISSO: DESCULPA!
PS: NÃO SEI SE AS MENINAS SÃO TÃO DESCONECTADAS COM ESSE DETALHE, ENTÃO DESCULPAS PRA ELAS TAMBÉM. BEIJOS DO TIO LUIZ! RSRSRS

 
At 2:42 PM, Anonymous Luiz Roberto said...

Olá Joyce,

o que voce está achando dessa enorme quantidade de bueiros explodindo pelas ruas do nosso querido Rio ?....Vietnam perde, nâo?...rss....

 
At 6:52 PM, Blogger Bernardo Barroso Neto said...

Não deu pra eu ver muita coisa nos anos 80 porque nasci em 1982, mas pelo menos em matéria de música teve muita coisa boa. Especialmente porque no inicio dos anos 80 os brasileiros conheceram e se encantaram por Clareana e Feminina.

 

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