jazz e liberdade
O que têm em comum o recém-falecido Paul Newman, Anita O'Day, June Christy? Pra mim, simbolizam um estado de coisas, ou estado de espírito, onde nos anos 50 o jazz era a música pop da América pós-guerra e havia uma impressão de liberdade no ar, embora se estivesse em plena guerra fria, com o macarthismo comendo solto por lá. Anita e June, cantoras de formação big-band, o disco 'Something Cool' de June rolando direto, com suas personagens que pareciam saídas de uma peça de Tennessee Williams, a narradora da canção dependendo da bondade de um estranho que talvez vá lhe pagar uma bebida. A era do swing já se acabando, os beatniks, pais dos futuros hippies, já on the road, Thelonious Monk pirando na maionese, Miles Davis ainda usando terno e se mandando para a Paris dos existencialistas, os anti-heróis – Newman, Brando, James Dean, e por que não, Chet Baker _ a América pré-Vietnam ditando a estética do mundo desde então e desde antes, e durante todo o século XX. Anita O'Day deslumbrante no festival de Newport, chapéu e vestido combinando como se estivesse num sweepstake, a voz quebrando tudo, sem barreiras. Que momento.
Os personagens desse tempo (ícones dos futuros bossa-novistas, então adolescentes) quase todos já morreram ou estão morrendo agora. Eu queria ter vivido essa época. Peguei a rebarba do chic, Audrey Hepburn de pretinho e pérolas em 'Breakfast at Tiffany's', Tony Perkins cantando jazz quando já não era mais moda _ meu início de adolescencia nos anos 60 já foi diferente. Nasci atrasada, perdi esse trem, e jamais consegui ter qualquer afinidade com a maioria dos meus companheiros de geração, fãs de rock'n roll. Levei alguns anos para achar alguma graça nos Beatles. A música mudaria, o cinema mudaria, o mundo estava mudando e acabou-se a inocencia. Pode a guerra do Vietnam acabar com a primavera? _ pergunta ingênua que a gente fazia numa enquete meio ridícula na faculdade de jornalismo, e tinha quem levasse a sério e respondesse. Pois pelo menos nos Estados Unidos acabou. A nossa primavera ainda duraria mais um pouco, só um pouquinho mais, até que por aqui também tudo mudasse.
Quais serão as próximas grandes mudanças do mundo, não sei prever. Mas com certeza começam por lá, pela América do Norte _ onde, aliás, já começaram.
3 Comments:
joyce,
a música do planeta,hoje,é um monte de 'samplers',um neguinho falando e mais um tanto de neguinhas berrando...
aliás,sempre acreditei que música e qquer outra manifestação artística fosse um privilégio da elite mesmo...não no sentido financeiro,mas intelectual...
no entanto,hj a elite se confunde com sua conta bancária e não exatamente com os critérios e refinamentos estéticos...tudo vai pro caldeirão e a música,no caso,está como está poraí...rs!
sou a favor da ditadura musical,dentro de casa...rs
minha filha foi proibida,na infância,de assistir ou ouvir os discos da xuxa...era a arca de noé,de vinícius e toquinho...assim como teve de engolir de pixinguinha a kurt weill,inclusive passando por tuas canções...hj,adulta,ela tem livre arbítrio...rs
hoje música também é moda...dá pra acreditar?...passou a estação,entra outra...ma che bruta sbórnia...
bom,esse comentário ficou quase um desabafo...desculpe...se não quiseres publicar,tudo ok?
abraçsonoros e amplificados
namaste
Faltou apenas mencionar a Radio JB AM, escola de boa música. Eu mesmo me lembro de Neal Hefti, nossos Nilo Sérgio e Ed Lincoln, Bobby Darin, Sinatra, Vic Damone, os Dicks (Farney e Haymes) e, claro, Julie London – o primeiro vinil da então moça, super sensual aliás, trazia o guitarrista Barney Kessel, influência para as novas harmonias emergentes da Bossa-Nova. Ray Charles em Stella By Starlight (Washington & Young), liderando paradas musicais. Os grandes compositors do cinema, como Rodgers, Kaper, North. Uma paixão indisfarçável por Leslie Caron. O jazz vivia um momento mais intimista, via West Coast. Dave Brubeck e seus compassos compostos confundiam teóricos e musicólogos ortodoxos. Enquanto isso, aos domingos, a pizza de mussarela da Cantina Sorrento, no Leme. Os sanduíches do Bob’s e outras gastronomias ligeiras. Quase 50 anos ficaram prá trás. Mas olhando o quadro político, social, financeiro e cultural, Brasil incluído, quem sabe desses 50, pelo menos 20 foram prá frente. Até hoje. Enquanto isso, quando posso, revisito Sinatra em Songs For Swingin’ Lovers, arranjos de Nelson Riddle, uma das obras-primas da música americana. Jorginho Guinle me passa pela cabeça.
Oi Joyce!
Apesar de não ter vivido essa época, pois nasci em 1982, eu adoro os filmes e as músicas americanas dos anos 50.
Como esquecer de Sinatra, Cole Porter, Marlon Brando, Paul Newman e tantos outros?
Mudando de assunto, comprei o seu livro Fotografei você na minha rolleyflex, estou adorando. Têm muitas histórias maravilhosas.
Parabéns por ser uma cantora, compositora e escritora maravilhosa!
Beijos
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