velhos no ano 2000
Leio que Jane Fonda, 71 anos, que também tem seu blog, tem escrito sobre a passagem do tempo e como administrá-la. Estava inclusive começando a escrever um livro sobre o assunto, quando lhe apareceu uma temporada na Broadway, oito espetáculos por semana. Melhor, impossível. Não há como se ficar deprimida com um ritmo de trabalho desses. God bless.
Sempre me pergunto, por exemplo, como foi que minha mãe aguentou a aposentadoria, depois de 38 anos de trabalho diário de 9-`as-5. Ela ia `a praia, nadava, lia muito, ajudava a mim e a meus irmãos quando precisávamos de algum suporte com nossos filhos e filhas. Também tinha seus momentos de nostalgia do trabalho no Ministério da Fazenda, conversando com antigas colegas e descobrindo novas formas de investir dinheiro (talento que infelizmente não herdei), o que para ela era diversão garantida. Era uma pequena investidora de classe média, mas extremamente esperta. Se dispusesse de mais capital, teria ficado rica, mesmo naqueles tempos de inflação. Nessa ela foi levando seu tempo ocioso, até os 90 anos de idade. Lúcida e fazendo palavras cruzadas.
Enfim, minha mãe e Jane Fonda, personalidades totalmente incompatíveis, entraram neste post como uma improvável mistura de siri com Toddy, por causa da repórter. Ela me procurou para uma matéria sobre o dia internacional da mulher. Já estou acostumada com isso, e respondo meio no piloto automático: esta é uma data em que, de alguma forma, sempre sou lembrada pra falar sobre o meu, o dela, o nosso genero. Ia eu, portanto, seguindo pela estrada costumeira, quando me dei conta de que não, ela não queria falar sobre meu trabalho, e sim sobre minha faixa etária.
Tomei um susto, pois ainda não me tinha caído a ficha de que ao ultrapassar a singela marca dos 60, além dos beneficios da meia-entrada, recebemos o bônus de ser considerados cidadãos de terceira idade. Levei uns trinta segundos para me refazer, ao fim dos quais, depois de explicar `a minha entrevistadora que não se fazem mais velhos como antigamente, disse a ela mais ou menos o seguinte:
Cara repórter: sei que o que você quer ouvir de mim se refere a tudo o que no momento não me interessa. Sei também que o motivo de você me procurar para esta alentada entrevista é o fato de eu ter entrado, assim de um dia para o outro, em idade provecta, ainda usando jeans e tênis. Você quer saber meus truques de beleza, meus segredos de sobrevivencia, quer que eu sirva de exemplo para outras senhoras na mesma faixa etária. Acho que não vai dar, sorry. Você me pergunta como me sinto aos 61 anos. E eu lhe afirmo, com toda sinceridade: não faço a mínima idéia. Não faço mesmo, e isso não é uma frase de efeito. Está aí um assunto que ainda não me tinha passado pela cabeça. Como me sinto? Deixa eu pensar um pouco. Um pouco mais esperta, possivelmente. Somos tão bobinhas na juventude. Mas posso garantir que me sinto mais capaz do que nunca quando o assunto é o meu trabalho. O que eu sei hoje sobre o meu ofício, eu não sabia há quarenta, trinta ou vinte anos atrás. Cada dia que passa é um dia em que conheço um pouco mais de mim mesma e redesenho meu lugar no mundo. Se estou mais ou menos feliz com isso, é outra questão. Uns dias estou, em outros quero fugir voando para uma praia do Caribe e arrumar um emprego num bar de hotel. Sério.
E o amor, você pergunta? Ah, l’amour! Oui, bien sûr, é muito bom, é bom demais, mas você não quer saber sobre amor, confesse. Amor aqui na entrevista é assim uma espécie de nome artistico para sexo, certo? Pode dizer logo. Você não usa a palavra porque acha que vai me escandalizar, mas foi você quem ficou chocada ao saber que eu durmo com o mesmo homem há trinta anos e ainda acho ótimo. Aliás, se durmo é justamente porque ainda acho ótimo. Ficou confuso pra você? Pois é, eu avisei. Não se fazem mais velhos como antigamente.
Marcadores: joyce moreno
11 Comments:
Eu que sempre escrevo "falo" tanto, só tenho ISSO a dizer:
SHOW DE BOLA!!!!!!!!!!!!!!DEZZZZZZZZZZZZ!!!!UHUHUHUHUHUHUHUHU!!!!!!!!!!!!!!!!
YEAHHHHHHHHHHHHHHHHHH!
AS MONTANHAS DO HUMAITÁ SE ABALARAM!
BJS
LUIZ
Adorei suas respostas,o seu amor, seu sexo eternizado e principalmente saber que tbm posso chegar aos sessenta sem estar a maior parte do meu tempo sentada!...E como sou das artes(desenhista) e quem é das artes cria com facilidade,espero muito remodelar da melhor forma a minha ocupação no espaço que atuo..."Quando eu crescer"[hahah],um dia quero ser igual as joyces, as marias, as glaucas, as lidianes (as janetes tbm) da vida... enfim... todas as grandes mulheres que sabem que viver não é fácil, mas é muuuuuito prazeroso. Ah,ia me esquecendo,dê um abraço na sua mãe, seja lá o espaço físico ou "metafísico" que ela ocupe nesse momento. Ela vai recebê-lo com já vem recebendo todas as vezes que nela pensa com carinho.
bj,Joyce!
janete de andrade
Oi Joyce!
Várias coincidências. Também soube ontem que a Jane estava com um blog e
dei um pitaco por lá. E também fui entrevistada recentemente , se não sobre a mulher, mas sobre a minha beleza. Claro, aos 54 anos podemos ser lindas :-))
Mas me espantei você ter tomado susto. Aos 43, precisando dos primeiros óculos e vendo os fios brancos, já comecei a olhar de bom grado a fila dos idosos no Banco do Brasil :-)
Adorei seu blog. Passarei a ser leitora assídua.
Angela Carneiro
Joyce, é tão bom ouvir e ler vc!
A propósito, volto a mencionar Herbie Hancock, um dos mais importantes nomes da história da música norte-americana e mundial. Pelo menos na minha opinião. Alguns puristas do jazz, conservadores, não acham isso. São aqueles que estão até hoje presos a um Charlie Parker, Billie Holiday, como se o jazz terminasse na década de 60. Há um DVD recente do Hancock chamado Possibilities, emocionante por sinal, onde ele, hoje com 68 anos, dá uma aula de jazz contemporâneo. O nome do DVD, Possibilities – nasceu de um CD com o mesmo título -, tem uma explicação. Hancock se refere primeiro às crianças. Elas não têm medo do desconhecido e procuram sempre identificar e explorar qualquer coisa estranha que aparece. E essa fase das descobertas não deve jamais ser interrompida com o tempo. A música proporciona infinitas possibilidades. Hancock diz que é muito fácil para um músico se manter numa zona confortável, aquela previsível, que repete estilos e sucessos antigos e soa sempre familiar aos ouvidos mais acomodados. Em Possibilities, ele traz nomes famosos da música pop. E cria, recria, alavancado pelo jazz, o mesmo jazz que fazia com Miles Davis. Hancock ganhou ano passado o prêmio máximo do Grammy com um CD – veio depois do Possibilities -, dedicado a Joni Mitchell, que inclusive teve a participação da brasileira Luciana Souza. Sim, um disco de jazz batendo grandes astros do rock e da música pop. Isso só havia acontecido com Stan Getz em 1963 (Getz/Gilberto). Herbie Hancock é um exemplo de que a chamada terceira idade não deve ser pretexto ou desculpa para que a vida diminua em intensidade. Principalmente no caso do artista.
PS. O DVD Possibilities, de Herbie Hancock, deveria estar sempre na mesinha de cabeceira de qualquer músico de bom-gosto.
hahaha!!!
muito bom!! do alto dos meus 25 aninhos, adorei!
Muito bom, adorei sua resposta.
Aliás adoro a sua música Velhos nos anos 2000, achei a versão que você fez melhor que a dos Beatles.
Querida Joyce, fiquei honrada de ser mencionada em seu blog. Sobre a entrevista, sinto não ter sido mais criativa nas perguntas. Falar sobre trabalho ? Acho que o Caderno 2 o fez com a devida competência em uma bela capa. Homenagear mulheres que vivenciam os 50, 60 e 70 de forma plena, é a proposta da reportagem.Seria muito mais fácil achar uma centena de celebridades com mais de 50 e com corpinho forjado de 20, do que reunir um time de mulheres que não brilham apenas pela aparência mas pelo vigor de seus atos, palavras e atitudes. Do alto nos meus 54 anos - jornalistas também envelhecem - e 30 anos felizes de estrada, parabenizo todas as mulheres e em especial as que tive o prazer de entrevistar, Marina Colasanti, Patricia Travassos, Cássia Kiss e você !
Um forte abraço,
Vera
Que absurda a indelicadeza cometida contra a repórter. Queria o quê? Matéria sobre a profissão? Era disso que se tratava a reportagem, ou uma homenagem à elegância de se chegar a terceira idade sem os tabus de antigamente? Sinto muito a reação negativa. da cantora
Caro Nelson, você tem toda razão. Fui indelicada mesmo, e até me desculpei num post seguinte com a repórter, que estava ali cumprindo sua pauta. O que me incomodou, na verdade, foi talvez o reducionismo da questão. Não vejo muitas matérias sobre homens na terceira idade e como eles lidam com o assunto... Pense nisso.
Oh, hi Joyce. I can't speak Portuguese but I like your music and your blog.
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