domingo, maio 26, 2013

Intolerância


Pra quem perguntou por onde andei: estive ocupada, vivendo. Mal chegamos da Europa, e uma semana depois já fomos para Nova York, onde fizemos uma temporada no Birdland, ao lado do meu brother Dori Caymmi. Essa nossa história fraterna pode dar encrenca, eu disse a ele, depois que me apresentou ao público, pela enésima vez, como 'my sister'. Eu é que não quero problemas com a irmã dele de verdade, Deus me livre. Mas fomos, passamos lá toda uma semana, e tão absorvida fiquei com a música e a vida, que sequer me lembrei de fazer fotos dessa temporada, aliás ninguém lembrou. Por isso estou aqui postando fotos antigas, a foto acima, de uma temporada no Japão em 2005; e esta abaixo, feita por Myriam Villas Boas, de um show em BH, de 2010. Mil perdões.

A volta ao Brasil sempre dá um certo estresse-pós tour. Outro dia eu disse isso a um jovem músico, filho de amigos meus, que ao chegar de uma turnê européia se sentiu chocado com algumas atitudes das pessoas aqui. Ele não gostou do que eu disse, mas garanto que é verdade, conheço bem a sensação. Principalmente o Brasil que temos hoje, crivado de intolerância por todos os lados. OK, não somos os únicos, mas por aqui está demais. Vejam na internet a repercussão do post do nosso amigo André Mehmari, que inocentemente foi fazer uma apresentação sobre a música de Ernesto Nazareth em Campinas para estudantes de idades entre 10 e 12 anos. Foi vaiado, xingado de todos os impropérios possíveis - e ainda assim levou sua apresentação até o final, com bravura e profissionalismo, mas certamente saiu dali arrasado. Por quê? Porque a escola hoje é um lugar onde alunos andam armados e agridem fisicamente os professores? Porque se perdeu a noção de autoridade, confundida com autoritarismo? Porque a música que a TV e a internet disseminam hoje para essa garotada é chula, grosseira, e não fala mais de amor, só de baixo sexo - subliminarmente passando a ideia de que o estupro é aceitável? Porque vivemos num mar de intolerância contra gays, contra mulheres, contra religiões que não sejam a nossa particular? Porque a impunidade dos grandes dá aos pequenos a certeza de que também ficarão impunes pelo que praticarem?

Ou porque, como disse outro dia Arnaldo Jabor em sua coluna, "pela influência do avanço da informação digital, turbinado pelo mercado global, foram se afastando do grande público as criações artísticas e literárias, as ideias filosóficas, os valores. Em suma, acabou toda aquela dimensão espiritual chamada antigamente de cultura que, ainda que confinada nas elites, transbordava sobre o conjunto da sociedade e nela influía, dando um sentido à vida e uma razão de ser para a existência." Será isso? Não sei. Sei que, como diz meu brother Dori, não foi esse o país que me prometeram. O pior é que não estamos sozinhos: outros países seguem esta mesma linha. Mas em alguns, ainda existe um resto de civilização que, por aqui, cada vez vejo menos.

Quando Mariana, nossa filha mais nova, tinha 11 anos, viajou conosco numa turnê que fizemos pela Europa. Na véspera da nossa volta, vimos que ela chorava. Perguntei por que, e ela simplesmente me disse - com 11 anos! - que estava chorando de pena do Brasil. Pois bem: hoje podemos todos chorar com ela. O Brasil precisa merecer o Brasil, mas o pessoal que nos governa parece mais empenhado em fazer com que haja uma melhora material, que é justa - mas esqueceu do crescimento espiritual, que só se dá pela cultura e pela educação. E assim vamos, rumo à barbárie. E que Deus nos ajude. Daqui a pouco, nós, trabalhadores da cultura brasileira,  teremos de viver em guetos, para não incomodar o pessoal que não admite que a gente exista. E chega de meias palavras: isso é fascismo, sim. 


domingo, maio 05, 2013

Europa 2013

 Tanta coisa a contar que até dá preguiça... Começamos com uma foto do nosso quarteto em Veneza, onde reencontramos amigos queridos e fizemos um show que nos deixou com o coração em festa... Antes disso, já estivéramos na deslumbrante Provence, paixão instantânea.

 Quem organizou nosso show em Aubagne (que fica ali do lado de Marseille) foi o próprio público. Crise na Europa, festivais e clubes de jazz com pouca grana, os franceses foram à luta e nos levaram em regime de crowdfunding: cento e poucas pessoas fizeram o que nós brasileiros chamamos de 'vaquinha' - et voilà! O show se fez.

Difícil falar de cada cidade, numa turnê longa como essa. Cada uma teve seus aspectos e seus momentos. Todas, sem exceção, nos deram alegrias. Em cada uma havia pessoas que tinham uma história própria pra contar, envolvendo a minha música em suas vidas. Isso não tem preço.


 Londres é sempre um must, ainda mais que este ano se completaram 20 anos de minha primeira apresentação por lá - e isso não deixou de ser lembrado pela imprensa inglesa: 20 anos de relação estável... Só alegria!

Abaixo, nossa passagem de som no Tapiola Hall, sala onde se apresenta a sinfônica de Helsinki, na Finlândia, e que se encaixa no que eu sempre digo: é impossível errar nesse tipo de sala de concerto. A música parece que toca sozinha.
Enfim, irei aos poucos lembrando uma ou outra coisa dessa viagem que foi, mais uma vez, tão feliz. A vida parece que se nutre desses momentos e fica em suspenso, esperando pelos próximos. Não há nada que se compare à alegria de fazermos a música que amamos para ouvintes que a amam de volta. Como eu queria que o Brasil abrisse os ouvidos um pouco mais!