quinta-feira, dezembro 25, 2014

A minha música

A minha música é neta do samba, mas não é bem samba.
É filha da bossa-nova, mas não é bem bossa-nova.
É prima do Tropicalismo e do Clube da Esquina, mas não é nada disso.
É sobrinha distante da música do Nordeste, mas só às vezes se lembra do parentesco.
É amiga do jazz, que a recebe sempre com festa. Mas também não é bem isso.
Já esteve pop, mas nunca foi.
A minha música não tem estilo.
Ou, por isso mesmo, vai ver que tem.

A minha música é simples, mas pode ser meio esquisita. Nem sempre é confortável. Mas gosta de parecer fácil. A minha música também gosta de algum estranhamento - compassos quebrados, tipo 7/4, afinações malucas, em D, em Eb, em C, por aí.

(E vejam bem, não estou falando de letras. Estou falando de música. Puramente música.)

Pois a minha música quase sempre tem arestas, é pontiaguda, é meio fora de esquadro - ou não.
Ela também pode ser muito simples, quase franciscana, se lhe der na telha. Pois ela é quem manda em mim.
Eu não mando nada na minha música. Ela vem quando e como quer. Não tenho controle nenhum sobre ela.
Mas ela sempre vem. Nunca me deixa na mão.
O canal vive aberto, para que ela desça sobre mim quando quiser. E ela sempre quer.
A minha música quer muitas coisas.
Quer ser ouvida.
Quer ser tocada (pois cantada ela já é).
Quer ser lida.
Quer existir e convidar outras músicas a existirem também.

A minha música não tem gênero definido, só porque foi feita por uma mulher.
Em 1968 um jornalista duvidou que a minha música fosse minha, justamente por isso. Achou que era boa demais para ser de mulher.
Obrigada, cavalheiro. Mas sou mulher, sim, e as músicas são minhas. Pari 3 filhas e umas 500 canções. Posso provar.

A minha música vem da grande árvore chamada Música Popular Brasileira, que é a mais perfeita tradução do Brasil. Aquela que se enraíza na cultura do povo brasileiro, e como disseram outro dia, nos lembra que, sim, somos um grande país. Apesar de tudo.
A minha música está ali naquela árvore frondosa, um galho pequenino com suas folhinhas. Mas lá está, morando ali, junto com seus outros parentes.
A minha música tem raízes, mas voa.
A minha música viaja bem.
A minha música paga minhas contas e bota o pão na mesa.
A minha música me aproxima do Divino.



quinta-feira, dezembro 11, 2014

Pois é isso!



quarta-feira, dezembro 10, 2014

A vida é viagem

Tem hora que dá vontade, ah, se dá. Tem hora que dá vontade mesmo. Sumir no mundo poderia ser uma alternativa. Não fosse o mundo esse mesmo mundo.

Tem hora que dá um desânimo. Dá, sim. O Brasil dá desânimo até nos mais patriotas e entusiastas. A gente tem de sempre 'estar fazendo' o chamado wishful thinking, pensamento positivo, o que os especialistas em mente humana chamam de 'terapia cognitiva'. É assim: só pense no que lhe dá prazer. Esqueça, ou ignore, todo o resto. Ou abstraia. Meditação transcendental é muito bom. Eu faço. Quase sempre.

Um tanque. Um tanque é excelente. Tarefas domésticas, quem não as tem? Só os que ainda vivem naquele mundo quase extinto do século passado. Lavo a minha roupa, sim. Faço a minha comida, sim. E quase tudo o mais. A faxineira também vem, claro, mas o ponto aqui é que esse trabalho do dia-a-dia não deixa ninguém pensar. Tem hora que é ótimo.

Uma estante em casa. Ninguém mais tem. Temos muitas. Cerca de sete, na casa toda, e já não cabe mais, mas os livros continuam chegando. De Jane Austen a Amós Oz, só nesta semana que corre, são tantas emoções. Aí, sim. Não contem com o fim do livro, palavra de especialistas. CDs também chegam, aos borbotões. Nem todos são bons, mas chegam. A criação continua. A vida é viagem. Viagem mental.

E viagem, é o que mais temos pra 2015. Europa, gelo e alegria, já em janeiro. Daí a gente se transforma no Brasil, representa um Brasil moderno, chique, criativo - que não existe mais, mas o pessoal lá fora ainda não sabe. Éta nós.


sábado, dezembro 06, 2014

Pro Cacaso

POEMA PASTICHE (ALTA ANTIFILOSOFIA)
(para Cacaso)
  
O poeta é um sedutor.
Seduz tão completamente
Que chega a fingir que é amor
O amor que deveras sente.

E a pessoa que o descreve,
Se a sedução lhe convém,
Não repara no que deve,
Mas só no que lhe faz bem.

E assim, inventando a roda,
Gira sem fazer questão
O reloginho de corda

Que guarda no coração.