quarta-feira, abril 16, 2014

TUDO - final da missão

E eis que meu amado 'Tudo' - CD autoral, independente, com 100% das músicas inéditas e 100% dos recursos tirados do meu próprio e combalido bolso - foi indicado ao Prêmio da Música Brasileira, como melhor CD de MPB. Concorro com dois colegas queridos, e a quem muito respeito: meu parceiro Edu Lobo e o talentoso Vitor Ramil.

Uma indicação como esta sinaliza algo de importante. Pois meus discos são assim meio órfãos, vêm ao mundo sem gravadoras majors e sem lobby algum que não seja seu próprio valor, se algum houver. Assim como valorizo imensamente as 4 indicações que tive para o Grammy Latino (em 2000, 2004, 2005 e 2010), pois esta é uma festa da indústria fonográfica, e o fato de discos independentes chegarem lá, ainda que sem a premiação final, é um passo gigantesco no reconhecimento de uma música que é feita com suor e muita batalha no dia-a-dia. Significa que, de alguma forma, esta música foi ouvida e apreciada o suficiente para fazer com que profissionais do ramo votassem nela. É um forte sinal de vida. Estamos vivos, estamos aí (título, aliás, de um belo CD d'Os Cariocas, também indicados ao PMB como melhor grupo vocal, e que abre com a minha - em parceria com Menescal e Lyra- 'Madame Quer Sambar')

(Não esquecendo que no começo de 2013 foi feita a pesquisa entre público e internautas sobre qual dos dois CDs já lançados no exterior eu deveria lançar no Brasil naquele ano. Entre 'Rio', CD de canções sobre minha cidade, e o CD de inéditas, as inéditas ganharam de lavada.)

Prêmios, e indicações para eles, não podem ser usados como juízo de valor. Muita gente bacana mereceria estar também indicada, há muitos talentos pipocando no Brasil que precisam ser mais reconhecidos - mas o Brasil não conhece, e talvez de fato não mereça, a música que tem. Por enquanto me sinto feliz e, de certo modo, representando a todos os underdogs da nossa área. Eu e outros amigos queridos que também foram indicados em outras categorias. Que possamos ser felizes e viver em paz com a nossa arte, com a música que, no dizer da minha parceira Léa Freire (também indicada com seu grupo Vento em Madeira), "alimenta a alma". É só o que desejo a todos.


segunda-feira, abril 07, 2014

relato das novidades

 Vai se chamar 'RAIZ' o novo CD feito para o Japão, que sai por lá dia 11 de junho deste ano. Em julho, mais uma vez lá estaremos, levando a música que faz parte das minhas raízes: samba, baião, e muita bossa-nova. Esta será a capa, feita por Philippe Leon, baseada na foto da nossa maravilhosa e talentosa Myriam Vilas Boas.
 Nestas fotos seguintes, o cara que pela primeira vez me levou a cantar num estúdio de verdade, o querido Roberto Menescal, que foi meu convidado especial nesse CD. Acabou que nossa parceria recente com Carlos Lyra, 'Madame Quer Sambar', saiu do repertório para dar lugar a 'Nós e o Mar', outra maravilha dele e de Ronaldo Boscoli.
 Kazuo Yoshida, meu amigo desde a primeiríssima viagem ao Japão, em 1985, foi nosso produtor.
Num próximo post conto a vocês como foi a gravação do outro CD, com o querido amigo Kenny Werner, que gravamos semana retrasada em NY, só voz e piano, com canções lindas, lindas. Tudo prazeroso, que bom. A vida é boa demais. Seguindo em frente.


terça-feira, abril 01, 2014

Primeiro de Abril

Onde você estava em 1964? Se você tem mais de 50 anos, ainda que estivesse no berçário, alguém vai querer saber. Eu vou logo dizendo: estava adolescendo, em casa, na praia, no colégio, preocupada com os namoradinhos da hora, com as provas do semestre, com meus LPs de João Gilberto. Minha família apoiou o golpe: minha mãe, bastante ousada em certas coisas e super conservadora em outras, temia que o apartamentinho de dois quartos no Posto Seis, que ela comprara com tanto esforço, tirado do seu modesto salário de funcionária pública, viesse a ser ocupado por famílias de camponeses, caso o Brasil virasse a Rússia de 1917. E acho que a maioria dos nossos vizinhos tinha os mesmos temores. Na noite do 1º de abril daquele ano, as janelas dos outros apartamentos ostentavam velas acesas, em sinal de apoio. Algumas famílias brindavam com vinho do Porto. A maior parte se arrependeria amargamente, depois que deu no que deu.

Quatro anos depois, quando houve o AI-5, o 'golpe dentro do golpe', eu já era outra pessoa, estudava na PUC, circulava no meio artístico, tomara conhecimento de mil coisas das quais não tinha a mínima idéia antes. Frequentava as passeatas, fazia shows para arrecadar fundos para publicações anti-regime, cheguei a esconder em minha casa amigos procurados pelo DOPS, passei pelo crivo da censura, estava ligada em tudo o que estava acontecendo. Como se pode mudar em apenas quatro anos…

Penso nisso enquanto vou lidando com questões do dia-a-dia, dois CDs gravados quase ao mesmo tempo, o que praticamente equivale a ser mãe de gêmeos, sem saber a qual devo dar atenção primeiro. Dois CDs que dificilmente sairão aqui no Brasil. Et pour cause: cada vez mais me convenço de que o destino de minha música é morar no mundo. 50 anos depois, temos uma democracia, mas certas coisas continuam no exílio.