quarta-feira, abril 29, 2009

pequeno músico


O pequeno músico fez 3 anos. 

Aos 11 meses de idade, a família descobriu que ele já era perfeitamente capaz de reproduzir cantando qualquer célula melódica, na divisão certa.

É uma criança bastante agitada e apronta mesmo, se deixarem. Mas se pintar música, ele para tudo e fica hipnotizado. Já vi uma vez um violinista de rua, na frente de um supermercado em Copacabana, atrair sua atenção durante quase uma hora. Sem mover um músculo.

Quando vem nos visitar, pede pra que a gente ponha meu DVD pra ele ver. Mas ele não quer o mais recente: quer o que tem o Proveta. "O meu Proveta", segundo ele diz. O cara tem bom gosto.


 


quarta-feira, abril 22, 2009

pequeno acesso de feminismo

Este é um fotograma do premiado curta-metragem "Penalty", da diretora espanhola Ana Martinez, para o qual eu compus a trilha sonora em 2006. É um filme sobre violencia doméstica, assunto que, ao que tudo indica, jamais sairá de pauta, desde as cavernas do Afeganistão até a civilizadíssima Europa.

A toda hora chegam notícias sobre o assunto. Cada vez mais, filmes e livros de diversas procedencias demonstram que a base moral de quase todas as religiões _ islamismo sim, mas também o judaísmo e o cristianismo tradicionais _ se assentam sobre a dominação masculina sobre a mulher. É como se fossemos um perigo social que devesse ser posto de lado, esmagado, impedido de opinar, de escolher, de criar, de conviver em igualdade de condições com a outra metade da humanidade. 

Ao mesmo tempo, igualmente não param de pipocar relatos de abuso sexual de parentes mais velhos _ pais, tios, padrastos, irmãos, vizinhos _ sobre crianças e adolescentes. No mundo inteiro. A pedofilia não é nova. Só está mais visível. 

Políticos acusados de estupro se elegem e tomam posse na África do Sul, no Paraguai, na Nicarágua. Atenção para o refrão: eu disse estupro. Não me refiro ao discreto charme de cafajestes elegantes como John Kennedy e seu seguidor Bill Clinton, seduzindo estrelas de cinema e estagiárias. Nesses casos, as moçoilas entraram na roubada por vontade própria, houve consenso. Estupro não: estupro é crime. Mas quem liga pra uma bobagem dessas? E afinal, a culpa é sempre da vítima. 

Sexismo é tão odioso quanto o racismo. É definir pela loteria genética o papel da pessoa na sociedade, conforme o equipamento que nos tiver sido designado nesta vida. Inacreditável é que boa parte da humanidade ainda ache isso normal.


terça-feira, abril 21, 2009

só que...

...ooops, esqueci de dizer! Sai em agosto no Japão, mas aqui no Brasil só em 2010. Mas vocês já imaginavam isso, com certeza. 

(na foto, entre mim e Donato no estúdio, feliz como ele só, nosso produtor Kazuo Yoshida)

Hoje em dia é difícil que uma gravadora se disponha a bancar integralmente um projeto. Quando isso acontece, há regras que precisam ser respeitadas. Uma delas, talvez a principal, é a de dar um bom período de exclusividade ao selo que bancou. Quando sai um projeto desses no Brasil, os exportadores caem em cima, e o CD chega de volta ao Japão a preços muito mais baixos do que o que foi fabricado lá, pois o custo da fabricação aqui é mais barato. Portanto, não se trata de injustiça, pelo contrário: é uma regra justa, para que quem de fato produziu não seja penalizado.

(detesto o uso da expressão "penalizado" neste sentido. Penalizado é quem tem pena, não quem sofre alguma consequencia. Mas a língua tem suas dinâmicas, e a gente acaba tendo de aceitar isso)

Na verdade, com as vendas online, isso muda muito, pois qualquer pessoa pode comprar qualquer coisa em qualquer lugar. Mas realmente sai mais em conta esperar o lançamento brasileiro, infinitamente mais barato do que mandar buscar e pagar taxas alfandegárias absurdas. É uma questão de paciencia _ e de sorte, pois muitas vezes acontece de o produto que se quer nunca vir a ser lançado aqui. Comigo já aconteceu demais...

Esses são os aspectos chatos da produção fonográfica, no fundo um business como qualquer outro. Pra nós músicos, o mais importante é a criação em si, e o resto é o resto. Mas não dá pra esquecer da outra ponta, o pessoal que compra porque ama essa música que fazemos. No meio dessa cadeia de produção ficam gravadoras, distribuidores, lojistas. A vida é assim mesmo, e cada um com sua função. Mas a música está... tinindo! Isso a gente garante.


sábado, abril 18, 2009

alegria!

Conforme encomenda de nossos amigos japoneses, eu e Donato entramos em estúdio para um novo projeto juntos. Desta vez, focado nas nossas composições, seja em parceria entre nós dois ou não. Como era de se esperar, diversão garantida. Hoje entramos na fase da mixagem; a gravação em si levou 3 dias _ menos até, se formos considerar que João só funciona a partir da uma da tarde. O oposto de mim, que sou um early bird.

Aí estamos no estúdio com Tutty e Jorge Helder, nossa base, mais a presença luxuosa de Mattis Cederberg, trombonista sueco integrado `a WDR Big Band de Colonia, na Alemanha, que participou como solista convidado no tema 'Aquarius', uma pérola donatiana dos anos 60, gravada na época por Cal Tjader. Mas o repertório tem essa e muitas outras surpresas.

Mattis, além do grande músico que é, ainda é pai dessa deliciosa figurinha, paixão total da nossa vida, alemãzinha mezzo sueca, mezzo carioca/baiana. Eles já voltaram para Colonia, e a casa ficou um vazio sem a adorável bagunça que ela faz. Mas não há de ser nada, nos veremos de novo lá pro meio do ano,  quando rolarem os próximos concertos na Europa. Somos uma família de circo, que muitas vezes tem de se encontrar na estrada mesmo.


segunda-feira, abril 13, 2009

sucesso

Sucesso nem sempre são as flores em vida.

Eu mesma já escrevi isso antes,  em 1997, no meu livro "Fotografei Você na Minha Rolleiflex': "coisa mais fluida, esse tal de sucesso: assim como vem, vai; de repente volta de novo, vai outra vez, torna a voltar, como as luas e as marés. Pior pra quem esquenta a cabeça com isso."

Sucesso, no início dos anos 80, quando estourei nacionalmente com 'Clareana', era ver sua música tocada nas rádios, o que, no caso desta canção em particular, aconteceu espontaneamente, logo após minha apresentação no festival da Globo. Foi como um rastilho de pólvora, os ouvintes ligando direto para as rádios, querendo ouvir aquela música que ainda nem saíra nas lojas _ e os programadores tiveram de correr atrás. Mas logo a seguir, ainda nesta mesma década, o que se tocava nas rádios passaria a depender integralmente de uma obscura prática chamada 'jabá', que consistia na compensação, financeira ou através da prestação de favores, por parte das gravadoras para as emissoras de rádio ou TV. Logo que assinei contrato com uma prestigiosa major, fui chamada para participar de um popularíssimo programa, e estranhei o baixo cachê que me fora oferecido, menor do que eu geralmente recebia antes de ter sido contratada. O executivo responsável por este departamento, sem grande finesse, cuidou de acabar logo com qualquer ilusão: "este é um programa que ainda paga. Os outros, nós pagamos para que você faça". Mais claro, impossível.

Quando decidi me tornar uma artista independente, no longínquo ano de 1983, eu sabia que o mainstream do sucesso não faria mais parte da minha vida. Foi uma decisão consciente, da qual jamais me arrependi. Hoje em dia é moda. Mas eu já sabia, desde então, que o modelão do sucesso pré-pago não teria futuro. Foi como adivinhar a crise financeira global antes que acontecesse _ estava na cara que aquele dinheiro todo não existia. Da mesma forma, aqueles discos feitos com orçamentos gigantescos, que nunca se pagariam apenas pelas vendas, estavam com seus dias contados. Alguns poucos ficariam ricos, outros muitos iriam tombar pelo caminho, mesmo tendo feito todas as concessões possíveis _  e eu não queria ser um deles.

Depois de muitos episódios que me comprovaram de vez a insustentável leveza do chamado 'sucesso', passei a enxergar essa palavra de outra maneira. Sucesso pode ser várias coisas. Muitas delas sei que alcancei, e me orgulho disso. Mas, principalmente, não esquecer jamais _ sucesso é sobreviver com dignidade, sem trair seu dom. 


sábado, abril 11, 2009

Noruega!

Conforme prometido, segue aqui a letra de 'Noruega, Gelo e Alegria', dos meus amigos Luiz Carlos Sá e Paulinho Machado. De um tempo onde a turma se reunia pra inventar essas coisas. Outras tantas divertidas bobagens surgiram naquela época, como o engraçadíssimo samba-enredo  'Exaltação ao Maestro Duprat' ("maestro... larararará... Rogério Duprat/ exaltamos o teu estro/ maestro Duprat (...) com seus bigodes corretos e hirsutos..."), de Zé Rodrix, Mauricio Maestro e sei lá quem mais _  e outras criações coletivas.

(muito obrigada, Renato, mas...  achei alguns erros na letra que você me mandou, e os estou corrigindo agora).  

                            NORUEGA, GELO E ALEGRIA

Noruega, teus campos brancos de neve
Nos trazem a mais feliz recordação
Dos momentos gloriosos
Inesquecíveis, heróicos
Da pesca do bacalhau, ô ô
Quem já viu o sol da meia-noite nascer
Pode nos dizer com mais razão, ô ô
Noruega, Noruega querida
Para sempre morarás no meu coração, Noruega
Baluarte da Europa Setentrional
Banhada pelo Oceano Glacial, ô ô
Teve em sua história grandes vultos
Reis, crianças e adultos
Que fizeram sua honra e tradição
As ardósias dos fiordes majestosos
As papoulas das falésias tão gentis
Ôo, ôo, ôo, ôo
Abre alas minha gente que a Noruega chegou
(diz, Noruega!)
Das planícies geladas e silenciosas
Partiram os temidos vikings
Navegando rumo oeste, mar afora
Descobriram a América antes da hora
Na bandeira o vermelho da coragem
O branco da pureza e o azul do imenso céu
Terra abençoada onde reside o bom velhinho
conhecido pela alcunha de Papai Noel, Noruega
Ôô, ôô, ôô
Abre alas minha gente
Que a Noruega chegou (bis)
(Noruega ou não é?)

É!!!!


domingo, abril 05, 2009

diário de bordo (final)


Sem Londres, não seria a minha tournée... Tocamos duas noites no Ronnie Scott's, e foi isso que se vê: casa lotada, ingressos esgotados com dias de antecedencia. Muita alegria!!! E no avião, minha alma canta.


diário de bordo (4)

Itália. Itália. Itália.
Como eu amo esse país, apesar de toda a bagunça e do inenarrável Berlusconi. Adoro as canções italianas dos anos 60, o neo-realismo e todo o cinema que veio depois, Fellini, Pasolini, Visconti, as comédias de Alberto Sordi, Vittorio de Sica, Mastroianni, La Loren. Que aliás me fez protagonizar uma cena cômica anos atrás, numa loja chique em Roma. A mocinha dizia que não tinha nada para o meu tamanho: 'a senhora tem busto muito grande'. E eu não pude deixar de dizer: 'por favor, signorina, então me dê o endereço da loja onde a Sofia Loren compra as roupas dela'. Depois dos 30 segundos de espanto, ela caiu na risada _ e achou alguma coisa que me servisse. Até tu, Roma!

Mas estou saindo do assunto. Estas fotos foram feitas em Longiano (antigo Vale das Cerejeiras), na Emilia Romagna, lugar deslumbrante, onde ficamos numa pousada deliciosa chamada Allogio al San Girolamo. Tocamos no teatro antigo da cidade (uma cidadezinha mínima, mas linda). Essa foi uma de nossas paradas no país.

As receitas de felicidades na Itália foram quase diárias, mas a mais especial aconteceu em Modena, no Baluardo della Cittadela, antiga fortaleza da cidade, hoje uma mistura de restaurante e centro cultural, onde fizemos o concerto. Eles têm um chef novo por lá, que, apostamos, vai ficar muito famoso num futuro próximo. O nome é Alessandro Dondi, e um dia poderemos dizer que comemos, de autoria dele, o seguinte menu:

Tortelloni di ricotta (sei, vocês pensam que conhecem esse prato. Mas isso não foi um prato, foi uma experiencia metafísica. Todos os meus sonhos da juventude se desmanchando na boca)
Insalata Misticata (temperada com balsamico... de Modena, claro)
Vinhos e águas locais. Não quisemos nem ouvir os nomes.

As sobremesas causaram controvérsia. A minha não deu muito certo, mas fui eu que escolhi errado. Devia ter pedido o cannoli do Rodolfo, ou a panna cotta do Tutty (segundo ele, essa panna cotta o levou a uma profunda reflexão. Deve ter sido incrível mesmo). Como não acertei em Modena, fui acertar em Longiano, com o melhor tiramisu que já comi na vida.

Em tempo: cappucino é na Itália. Eles inventaram, eles sabem fazer. O resto é café com leite.

De quebra, uma surpresa. Há muitos anos atrás, em 1987, se não me engano, estive no Equador com meu amigo Mauricio Tapajós, onde conhecemos uma garotada italiana que fazia um periodo de voluntariado lá, junto aos povos indígenas. Todos muito jovens, solidários e oferecendo o melhor de si, ali em Quito ou na selva. E eis que muito tempo depois, reencontro dois deles, Emmanuela e Stefano, hoje casados e com filhos, vivendo em Bolonha. A surpresa maior foi constatar que ela, Manu, se tornara violonista e compositora talentosa, de inspiração brasileira. Aqui estamos juntas, pois ela foi me ver nos shows que fizemos, e acabei gravando uma participação no seu próximo disco. Na correria da tour, eu não teria tempo de ir até um estúdio, por isso o estúdio veio até o nosso hotel, e lá mesmo gravamos.


sábado, abril 04, 2009

diário de bordo (3)

The hills are alive with the sound of music!!!

Nevava muito quando chegamos `a Austria e continuou nevando durante o nosso primeiro concerto na terra (o primeiro foi em Schwaz, no Tirol, de onde vem estas fotos; depois iriamos para Viena, onde o frio já não era tanto, mas chovia bastante)

('no Tirol só se canta assim/ lerolerooo... lerolerooo... lerolerooo...' dizia a marchinha de carnaval da minha infancia. 'O nosso lerolero é diferente/ o clima aqui é muito quente...' E eu sempre fantasiada de tirolês _ jamais tirolesa _ nos bailes de clube ou de rua. Eu adorava carnaval e o Tirol faz parte disso. Meus amigos de Schwaz jamais entenderiam a estranha relação carnavalesca que tenho com a região deles)

Nossa amiga Anna, tirolesa da gema, passou por um longo periodo de sofrimento, com a perda do companheiro de vinte anos, depois de longa e dolorosa doença. Agora, ela diz, quer simplificar a vida, já teve tudo o que podia de alegria e prazeres; foi, em suas palavras, 'mimada demais' pelo seu amor, e essa viuvez foi o que de pior podia lhe ter acontecido _ portanto, agora o que vier é lucro. Até mesmo enfrentar uma roubada no caos aéreo natalino em Guarulhos pode ser coisa divertida, pra quem acha que não tem mais nada a perder. "Já que eu estava lá", nos contou ela, num delicioso jantar improvisado em sua casa, "que seja: Guarulhos chachacha!"

E eu ia deixar passar uma chance dessas? Claro que peguei o violão assim que chegamos ao hotel, e no show da noite seguinte o novíssimo 'Guarulhos Chachacha' já fazia parte do repertório. Com 'uh!' no final e tudo.


(as datas _ erradas _ nas fotos continuam me irritando, mas agora não há mais o que fazer, os originais já foram deletados. Eu devia ter pensado nisso antes, mas sou analfabeta funcional em assuntos digitais. Miroca, tem algum programa que resolva?)

E não é que ela resolveu mesmo??? (v. foto acima) E ainda me mandou um email dizendo: "quando você vir aquelas mulheres perfeitas nas revistas _ DUVIDE!"


sexta-feira, abril 03, 2009

diário de bordo (2)

Depois da Finlandia veio a Suécia, nossa velha conhecida, desta vez na cidade de Gotenborg. Ficamos num hotel em forma de navio e janelas redondas de escotilha, bem engraçado. O show foi bom. A comida, nem tanto. Mas deu pra sermos felizes só com a música.

A vida da gente é cheia de surpresas, e a próxima parada nos levaria a um dos lugares mais incríveis que já vimos na vida: a cidade de Trömso, no norte da Noruega, perto do círculo polar ártico. Ou seja, ali pertinho do Polo Norte! É um lugar lindíssimo, indescritível, diferente de tudo. E gelado, claro. Tudo muito abaixo de zero, e o inverno já ia terminando. Se não estivesse, teríamos noites ininterruptas, quando por dois meses o sol não aparece.

Mas tivemos casa lotada e platéia muito, muito quente _ apesar de estarem acontecendo dois outros concertos importantes na mesma noite na cidade. Foi bom demais.

Uma receita de felicidade em Trömso pode não ser exatamente a que eu escolheria. Mas nosso amigo Rodolfo provou e achou ótimo: carne de rena, que eu, Tutty e Helinho recusamos, horrorizados. Afinal a rena é amiga, ajudante de Papai Noel, essas coisas todas, e nenhum de nós três come carne há muitos anos. Mas enfim, tem gosto pra tudo, e pelo menos não rolou carne de foca ou de urso, que pelo que soubemos também são pratos típicos. Carnes fortes e gordurosas para aguentar aquele frio todo.

Quanto a nós semivegetarianos, pedimos uma pasta al pomodoro, que coisa mais básica não há.
(mas o Rodo adorou a rena, assumidamente...)

As fotos de Trömso não fazem justiça `a beleza da paisagem. São quilometros e quilometros de uma luz incrivelmente branca, lagos e mares gelados (o que também havia na Finlandia), uma beleza selvagem e grandiosa.
(não sei por que cargas d'água fui deixar data nessas fotos, estraguei tudo)

(Há muitos e muitos anos, fiz os arranjos vocais para um trio chamado Umas & Outras, que eram na verdade Regininha, Dorinha e Malu, as cantoras da Turma da Pilantragem em carreira "solo" (solo de três pessoas, por assim dizer). Entre outras pérolas, elas gravaram um samba-enredo de Luiz Carlos Sá e Paulinho Machado, chamado 'Noruega, Gelo e Alegria', do qual muito me lembrei nessa breve estada. Em outro post, escrevo a letra, que tenho no fundo do meu quase infinito baú de memórias. É hilária.)

O frio mais frio já estava quase acabando, pois dali passaríamos para a Austria e em seguida para a Itália, onde as receitas de felicidade são tantas. Mas adoramos essa passagem pela Escandinávia.

diário de bordo (1)

Depois de mais de três semanas na estrada, meu coração de globetrotter volta pra casa de malas cheias: foram muitos acontecimentos, muita gente, muitos lugares, muito trabalho bom, descansar carregando pedra. Começamos pela cidade do Porto, onde, numa bela homenagem, foram abertas as comemorações dos 60 (!!!) anos de carreira de meu parceiro João Donato, que se completarão em 2010. Um show imaginado por nosso amigo e bravo guitarrista Ricardo Silveira, com participação minha e de Emilio Santiago, todos nós aqui na foto.

O concerto foi na Casa da Música, uma belíssima sala de quase dois mil lugares, que se encheu de gente curiosa para ver nosso João (e a nós outros também, claro). É uma grandiosa obra arquitetonica, e amigos locais nos contaram que sua construção foi tão complexa e controvertida quanto a da Cidade da Música, aqui no Rio, e a da Ópera de Sidney, na Australia _ com orçamentos triplicando `a medida que as obras avançavam, prazos estourados e outros pepinos do genero. Não estamos sós! Mas, pelo menos neste caso, visivelmente valeu a pena, é uma sala de concertos maravilhosa, de acústica impecável e infraestrutura perfeita.

(e eu e João voltaremos a nos encontrar em breve, agora mesmo em abril, desta vez em estúdio, para mais um CD juntos, primeiro saindo no Japão e depois, ano que vem, por aqui)

Felicidade, em Portugal, pode ter a seguinte receita:
Creme de aspargos
Gambas ao alho
Queijo da Serra, acompanhado de torradas quentinhas e um cálice de vinho do Porto (tudo produzido ali mesmo, que maravilha!)

(Como vocês podem ver, sou adepta fervorosa da teoria slow food de que o melhor é sempre aquilo que está por perto, bem na área de produção.)

O que nos leva a Paris. Um intervalo de quatro dias entre o show para o João e o inicio de minha própria tournée serviu de desculpa para uma merecida parada em uma das cidades que amamos _ moro um pouquinho em várias delas, Nova York, Londres, Tóquio, o meu amado Rio _ e em Paris também. São lugares onde temos nossos bairros prediletos, os lugares de comprar comida, os cinemas que frequentamos, os parques onde caminhamos nos intervalos de um trabalho pra outro, e os hotéis onde ficamos por nossa conta, sempre mais simples do que aqueles em que nos colocam quando estamos tocando em algum lugar.

Nosso QG em Paris fica em Montparnasse, e o melhor programa do mundo é sentar num café e olhar a vida passando. Bom, bonito e barato. E merecido, depois de um conturbado início de ano, cheio de sustos sem conta.

Felicidade, em Paris, pode ter o seguinte menu:
Soupe `a l'oignon
Pain de maison
Assiette de fromages, un verre de Bordeaux Mouton Cadet. E água Badoit. Tudo local.

(eu queria tanto gostar de ostras... está bem na época e é um prato lindo _ mas é o mesmo problema que tenho com pudim: a consistencia)

Outro menu de felicidade na França pode ser o do café da manhã:
Café au lait + 1 tartine au beurre. E estamos conversados.

(Não posso deixar de falar na consciencia francesa, sempre esperta e alerta. Na França se pensa e se verbaliza muito. Nos cafés próximos ao Jardim de Luxemburgo, área universitária, uma juventude ligada, conversando, discutindo, fazendo planos, todos juntos em greve, professores e alunos contra os planos do governo. Maio de 68 não terminou por lá. Na nossa brasserie de escolha, Le Select, não pudemos deixar de escutar (devido ao volume) a conversa profunda entre dois amigos de idades diferentes, que começaram falando de mulheres ('o que elas querem afinal de contas?'), depois passaram para assuntos teológicos, Deus e suas variantes (um era religioso, o outro ateu) e quando saímos o mais velho mostrava seu novo poema para o outro, que analisava palavra por palavra, caprichosamente, com ferramentas literárias apropriadas, de quem já fez muitos mestrados na vida.
No computador do hotel, abro na página do meu provedor, e as principais manchetes do Brasil são sobre o BBB9. Não faço a mínima idéia de quem são aquelas pessoas)

Chegamos a Helsinki inaugurando a tournée e a parte gelada da viagem. Foi tudo perfeito por lá, o show foi campeão, a organização do festival se esmerou nos mínimos detalhes, e a casa estava lotada. Melhor, impossível.

(acabo de ver que a foto acima está datada erradamente. Ainda não sei mexer nessa nova camera que ganhamos)

O Carnaval no gelo prossegue nos próximos posts.