domingo, abril 25, 2010

festival em maio

OK, verdade que as 'Leyendas de la Bossa Nova' aqui são mesmo Menescal e Donato... nós outros somos meros seguidores. Mas este festival nas Ilhas Canárias agora no começo de maio promete no mínimo diversão, pra nós e pro público hispano-canário.

Já participei do Festival Tensamba com minha banda em 2005 (com Tutty, Rodolfo e Proveta) e foi uma ótima experiência. A 200 km da África, mas pertencendo à Espanha, as Ilhas parecem o Rio de Janeiro dos anos 60. Uma caminhada com direito a sorvete no calçadão em Tenerife é um ótimo programa, que esperamos repetir nesta viagem.



domingo, abril 18, 2010

direitos de autor, parte 3

O assunto hoje é sério, pois trata simplesmente do nosso direito de existir, ou do reconhecimento à nossa profissão como... profissão. Depois de tantas ameaças, como as novas tecnologias de download, creative commons e outros babados, agora vem o inacreditável MinC - o Ministério da Cultura, não o querido Carlos Minc, que gosta de música e não tem nada a ver com isso - com uma nova lei de direito autoral, querendo mexer no imexível.

É no mínimo estranho que aos 45 do segundo tempo venha o governo brasileiro querer 'estatizar' nossa criação. Sobre o assunto, já tivemos aqui no blog um sensato depoimento do grande Sérgio Santos ('Direitos de Autor, parte 1' - post do dia 15/6/2009) e um hilário (e infelizmente, premonitório) texto de Danilo Caymmi ('Direitos de Autor, parte 2', post de 19/6/2009). Seguem agora os comentários (em preto) sobre o texto da nova lei (em azul) de Antonio Adolfo, no momento morando em Miami, mas sempre atento às questões da nossa classe.

Estamos ligados. Nós estamos por aí, sem medo.


Sobre a questão geral: A finalidade é ampliar
> e assegurar os direitos dos autores, que passam a ter maior poder de
> arbítrio sobre suas obras, compatibilizando-os com os da sociedade de ter
> acesso à cultura. 
Há um equívoco muito importante, pois o que estão propondo é menor poder, menos direitos para os autores, e essa questão de “democratização de acesso à cultura”, que o MinC vem proclamando há meses é um sofisma, já que cabe, sim, ao Estado propiciar esse acesso, não só à cultura, mas, também , à saúde, educação, segurança e outros, MAS, POR FAVOR, SEM PREJUÍZOS PARA OS QUE PRODUZEM, PARA OS QUE CRIAM... Usar os criadores e titulares de direitos para se conseguir essa tal “democratização” é , no mínimo, um crime, usurpação, uma injustiça. Revoltante!!
Sobre os contratos , é importante ressaltar que a lei 9610 já contempla diferentes formas: cessão, autorização, licença, temporárias ou não, remuneradas ou não – SERÁ QUE LERAM? - , - mas vê-se que, estranhamente, na proposta - claro que dá pra notar a mão ou a teoria ultrapassada do CC aí – eles consideram a possibilidades de não remuneração!!! Acho que deveria ser esclarecido que a 9610 já contempla todas essas formas de contratos e que numa lei não dá pra se especificar ou explicitar o instrumento jurídico da licença de uso. - Como? Já está bem claro na lei atual. O que certamente ocorrerá é que se percam num novo texto, já que mostram pouca vivência e conhecimento do assunto – vide abaixo: conclusões.
E, também, a lei do DA prevê direito ao titular original de dissolução do contrato por várias razões– o que há é uma falta de informação muito grande de varios lados. 
O problema é que se criam leis, mas não se fiscaliza o seu uso e, aí, a parte mais fraca acaba sempre se dando mal.
Mas , não dá pra deixar escapulir aqui 
um ponto que me choca profundamente aos que têm algum discernimento. Sao os tais Casos excepcionais!!!.../ serem usadas obras protegidas sem autorização
> prévia dos titulares do direito. ....e.... onde se abrigam sob as expressões “limitações e exceções da lei”.....e.... uma vez que a defesa de  maior equilíbrio de direitos em prol dos autores não os isenta da responsabilidade para com a sociedade..... 
Há ali questões altamente lesivas aos titulares dos direitos. 
E um dos itens mais chocantes é: a 
Licença Não-Voluntária – Isso geraria um sem número de injustiças com os titulares
> Atendendo à demanda social, propõe-se criar o instituto da licença
> não-voluntária, instrumento que permitirá ao Estado licenciar certas obras
> (livros e artes visuais) cujo acesso esteja restrito em detrimento do
> interesse público relacionado à educação e à cultura
. Essa licença só deverá
> ser concedida em casos específicos e justificados e sempre implicará em
> pagamento aos titulares pela sua concessão. 
Ela seria aplicada nos seguintes
> casos: 
para obras em que é impossível identificar ou localizar o seu autor
> ou titular, as chamadas obras órfãs; 
quando os titulares recusarem ou quando
> forem criados obstáculos não razoáveis à exploração da obra
; ou para obras
> esgotadas, no caso de livros, quando a obra  já tiver sido dada ao
> conhecimento do público há mais de cinco anos, não estiver mais acessível em
> quantidade suficiente para satisfazer as necessidades da sociedade. 
Assim,
> esse instrumento fornecerá meios ao Estado para garantir a completa
> implementação do artigo 215 da CF, que estabelece o pleno acesso ao
> patrimônio cultural brasileiro, ao criar instrumento legal que lhe permita
> licenciar obras de interesse público, inacessíveis ou com acesso restrito
.

E tem muito mais. 
Conclusões: 
Vemos claramente que a proposta é amadorística, fraca, confusa e ameaçadora aos titulares de direitos, incluido-se os de Direito Conexo, assunto este abordado de forma bem confusa na proposta de revisão. Há lacunas muito grandes, o que mostra falta de aprofundamento no assunto Direitos Autorais. 
A Lei 9610/98 continua atual, talvez uma das mais completas e atuais no mundo hoje em dia, pois contempla praticamente todas as formas de titularidade e uso do DA. Até mesmo em assuntos polêmicos, usados como elementos falsos para uma urgência de mudança da Lei, como os que se referem a proibição da cópia, a Lei 9610 abre possibilidades de permitir ou abrir excessão, mediante autorizacão (gratuita e remunerada) do(s) titulares(s). Ora, se deixarmos que isso fique livre como proposto nesse texto de revisão, estaremos perdidos. A Lei 9610 consegue sintetizar todas as questões utilizando um texto claro e abrangente. Somos contra a usurpação dos nossos direitos e vemos o Estado propondo que nós, criadores e afins deixemos de lado nosso direito de lutar pelo que é nosso, através de sua intervenção.
A Proposta de revisão é confusa também em ítens importantes como: direitos conexos, cópia – utilizam até o termo 
copista de forma equivocada, mostrando falta de vivência dos que redigiram (a proposta) - e, continuando: edição, gestão coletiva, criação de novas associacões de repasse dos direitos dos titulares (!!!?) e ainda coloca: A proposta permitirá que novas entidades de arrecadação e distribuição de
direitos autorais sejam criadas
, ...... direito de reprodução, jabá – ela é perigosa, por exemplo quando se refere ao jabá e declara, por exemplo:Embora a proposta de revisão da lei não tenha caráter punitivo   ...., e, ainda, mais uma vez contra nossos interesses, sugere que se prescreva ação civil por violação a direitos
autorais patrimoniais prescreverá em cinco anos, 
Há muito mais...
Não deveremos ser contra o ressurgimento de um CNDA, com representantes dos titulares e com agentes do Governo, estes como convidados para auxiliar os titulares no que se refere à fiscalização em relação ao abuso e das injustiças que se praticam em contratos e que não seriam corrigidos nessa proposta de revisão de lei e, sim, tao somente, com a fiscalização e punição. Mas deve-se deixar claro que esse Conselho deve ser um Conselho nosso, dos titulares, sugerido e criado por nós, para a nossa proteção.
Há pequenos ajustes que devem, sim, ser feitos na atual Lei, principalmente na questão da filiação às Associações de Titulares De Direitos.
E, finalmente, pergunta-se porque um interesse e uma urgência tão grandes em se alterar a Lei do DA?, quando sabemos que há leis que estão, estas sim, totalmente  ultrapassadas, abrindo brechas que nos prejudicam, como, por exemplo, a CLT, que nao contempla diversas novas formas de relações de trabalho dos músicos ou a propria Lei 3857, que criou a Ordem dos Músicos do Brasil...., também totalmente ultrapassada. E tanta coisa mais tão importante que, mesmo fundadas em leis, não são seguidas e fiscalizadas, permitindo, por exemplo, que nós, músicos (instrumentistas, cantores, compositores, arranjadores e regentes) sejamos lesados a todo momento.
Há ainda muita coisa....


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quinta-feira, abril 08, 2010

Feminina, 30 anos

No Dia Internacional da Mulher o site MPB.com me pediu um texto sobre os 30 anos de lançamento do meu disco 'Feminina', seus desdobramentos e reflexos no nosso cancioneiro. Passado já um mês da publicação pelo site, peço licença aos leitores para reproduzir este texto aqui no blog.

Em 1980 minha vida estava mudando. Depois de um período de parada quase total das atividades musicais, por conta do nascimento de minhas filhas, voltei a compor direto, vi minhas músicas serem gravadas pelas mais importantes vozes do Brasil e finalmente fui convidada a gravar um disco meu pela EMI-Odeon. Este disco se chamaria "Feminina", e seria um marco em meu trabalho e em minha vida. 

Para começar, porque pela primeira vez, eu tinha o controle absoluto do meu próprio trabalho. Tudo ali era pensado e criado por mim: as músicas, os arranjos básicos, os violões, os vocais, a maioria das letras, as idéias, o conceito. Pois era um disco autoral e conceitual, e refletia exatamente tudo o que eu queria dizer naquele momento, a partir do discurso no feminino singular, que no comecinho de minha carreira fora quase que apedrejado em praça pública. Enfim, era uma mulher assumindo o controle.

Quase todos os meus maiores sucessos de carreira estavam contidos naquele LP. Muitas daquelas canções já haviam sido gravadas por Elis, Milton, Nana, Bethania, Boca Livre e outras vozes. Mas ainda havia coisas inéditas, e com uma destas, "Clareana", fui classificada no Festival MPB-80 e explodi nacionalmente, no mesmo palco onde fora vaiada 13 anos antes ao cantar "já me disseram/ que meu homem não me ama". A menina de 19 anos que dizia "meu homem" em 1967 era chocante demais para o Brasil daquele momento. Mas a mãe que em 1980 cantava o amor por suas meninas estava livre para ser amada pelo povo brasileiro, àquela altura já cascudo por declarações de cama, mesa e banho, feitas por 10 entre 10 novas cantoras que chegavam na MPB aos borbotões.

Essa dicotomia santa/devassa sempre me incomodara na música brasileira, e eu não queria estar em nenhuma das duas posições. Por isso mesmo tinha feito, com minha parceira Ana Terra, músicas como 'Essa Mulher' e 'Da Cor Brasileira'. E propunha uma reflexão mais abrangente do assunto em 'Feminina', um samba-jazz-quase mandala, de mãe pra filha e de filha pra mãe, questionando se 'o cabelo, o dengo, o olhar' teriam mesmo tanta importância assim na construção da nossa identidade.

Hoje ninguém mais se assusta com mais nada, graças a Deus, e nós mulheres podemos inclusive pegar o bonde de volta pra casa e parir, criar, trabalhar, amar, fazer ou não fazer tudo isso ou nada disso, conforme nossa escolha. Tenho certeza de que a música brasileira foi importante nesse movimento. E cada vez que vejo no YouTube uma criança cantando 'Clara, Ana e quem mais chegar', ou um coral de meninas cantando "ô mãe, me explica, me ensina"', ou Maria Rita revivendo 'Essa Mulher' com lágrimas nos olhos, ou Maria Bethania cantando 'é o homem da cor brasileira, a loucura, a besteira que dorme comigo" - quando vejo tudo isso, sei que ter gravado o "Feminina" há 30 anos atrás teve alguma participação na construção do nosso imaginário feminino.


quarta-feira, abril 07, 2010

nossa rua, day after




terça-feira, abril 06, 2010

águas de março em abril


"Todos sabem como foram as águas em 60. Como choveu!" disse Tom Jobim no texto de contracapa do 2º disco de João Gilberto, 'O Amor, o Sorriso e a Flor', produzido e arranjado por ele durante uma temporada chuvosa na serra. Águas caudalosas no Rio não são novidade, aparecem de tempos em tempos. Mas desse jeito, havia muito que não acontecia. Diz a prefeitura que é o maior volume de chuvas desde 1962.

(Eu não me lembro das chuvas de 1962. As de 1966 e 1988, lembro bem)


Moramos numa encosta, num prédio aparentemente seguro. Mas um pedaço dessa encosta, na rua ao lado, desabou na noite passada, atingindo um clube que fica nas imediações e deixando uma casa próxima com os alicerces a descoberto. Não sei se construir em encostas, ainda que com toda a segurança possível, é correto. Nas favelas, o pessoal das construções informais é quem mais está sofrendo, e até o momento a conta já ultrapassou os 80 mortos.

Já passei por terremotos e tufões no Japão, e nunca tive medo. Sempre senti firmeza nos edifícios de Tóquio, que segundo me dizem, são preparados para acompanhar o balanço da terra, como se tivessem fundações de rolimã. Mas no Rio de Janeiro, neste momento, já são mais de 24 horas de chuva ininterrupta na cidade. E não é pouca chuva: 

Mas chuva grossa quando cai causa temor
Chuva perigosa, chuva traiçoeira
Chuva levando tudo o que tem de valor
Chuva caprichosa, chuva da ribeira
Chuva respondendo
Nunca mais silenciosa
Chuva caudalosa feito cachoeira
Chuva carregando
Rua, gente, casa, roça
Tudo o que possa
Pra ribanceira

É assustador e preocupa. Não há o que fazer a não ser esperar que passe.


domingo, abril 04, 2010

jards rides again

Assistimos ao documentário de Marco Abujamra e João Pimentel sobre nosso queridíssimo amigo Jards Macalé (na foto acima, Macau está na contracapa de um de seus discos mais conhecidos, o de 1972, ao lado de Lanny Gordin e Tutty Moreno. Isso é que foi power trio...) Ficamos felizes em ver nosso amigo revisitado e reconhecido, com a importância que sempre teve. Eu, pessoalmente, gostei de rever a mãe dele, d. Lígia, linda e cheia de saúde apesar de já idosa, ela que era uma querida com todos os amigos e amigas que passavam pelo apartamento da família Anet na rua Visconde de Pirajá, em cima da papelaria Reis, no finalzinho de Ipanema. 

(Macalé também frequentava o apartamento de minha família, no Posto Seis, e chamava minha mãe de 'Zemir, a Pérola de Madagascar' - um bom nome para uma possível continuação de 'Sandokan, o Tigre da Malásia'... Nós nos identificávamos também nas nossas origens, duas famílias de classe média-bem-média na Zona Sul do Rio. Uma das melhores amigas de minha mãe era justamente uma tia dele.)

Tutty se reviu numa cena de super-8 em Londres, do arquivo pessoal de Macalé, anos 1970, ao lado de outros amigos. Revimos Giselda Santos, também amiga querida, na época companheira do Macau. Vimos e revimos muitas coisas que nos trouxeram lembranças de todo tipo. 

Ficamos incomodados com a fala de Gilberto Gil sobre "os que cuidaram da carreira" e os que "não cuidaram". Arnaldo Bloch já disse tudo sobre esta fala em seu blog, e eu não vou chover no molhado. "Cuidar da carreira" é uma ideia subjetiva. Alguns de nós tivemos lá nossos embates com o sistema e fomos (ou não) punidos por isso. Outros fizeram as concessões que Gil diz serem necessárias a partir da própria vida, do encontro com o outro. Eu quero ter o encontro com o outro sempre levando em conta o que na filosofia se chama "the otherness of others", ou a alteridade do outro (em inglês fica melhor). Ou seja, quero respeitar cada um e cada qual com sua verdade, sua crença e sua arte, até para que as minhas sejam respeitadas também. Macau carregou e carrega nas costas a cruz do maldito, que ele certamente não aguenta mais. Se já é hora de anistiar Simonal, como bem disse Mário Prata, eu também diria que já passou da hora de aliviar Jards Macalé desse peso de décadas. E simplesmente apreciar o artista absolutamente original que ele é.

Sempre me lembro de uma história engraçada, contada por um conhecido músico que tinha feito parte de um grupo nos anos 50 chamado 'Os Milionários do Ritmo'. Ele dizia, referindo-se ao líder do conjunto (não sei se justa ou injustamente): "ele ficou milionário, nós ficamos com o ritmo..."

Malditos ou benditos, o fato é que milionários não ficamos. Estamos todos "fazendo força pra viver honestamente", como diz o belo samba mangueirense. Cuidando da carreira, cuidando da vida.