sexta-feira, março 28, 2008

encontros

Olha eu aí com meu amigo querido Dori Caymmi, que freqüenta este blog a toda hora, embora não saiba disso _ ele que nem sequer sabe ligar o computador, como já contei aqui. Ele aparece neste post porque estaremos fazendo música juntos várias vezes nas próximas semanas.

Começando pelos shows que farei na FECAP, belo e novo teatro paulista, onde, com o deslavado pretexto de comemorar 40 anos de carreira (eu que não estou nem aí pra efemérides do tipo), estarei aproveitando para encontrar amigos, parceiros e intérpretes da minha música com um violão e/ou um piano do lado. Dori estará lá, assim como Zé Renato, Francis, Donato, Menescal, Leila, Monica & Teco, Zélia e minhas parceirinhas/ filhas/ cantoras Clarinha e Aninha.

Festa assim é ótimo, e eu não tenho vergonha nenhuma de confessar que tudo não passa de um reles truque pra encontrar pessoas queridas, fazer música e ter a chance de a gente se divertir um pouquinho neste mundo maluco, fazendo aquilo que se ama.

Pra mim, que moro numa cidade violenta e assolada por uma epidemia que inclusive já me atingiu, será incrivelmente prazeroso pensar somente em música por duas semanas. É trabalho? é, e está enlouquecendo a equipe de produção pra conseguir juntar esse povo todo organizadamente. Mas é prazer também, e depois que virar DVD, vai ficar ainda melhor.

E melhor ainda será estar ao lado de um grande músico como Dorival, que assim como eu, é facinho, facinho na hora do trabalho. Rolling Stones, 150 toalhas brancas no camarim, pra essas coisas eu não tenho mais paciência, não.


sábado, março 15, 2008

parceiros e parcerias

Acabo de ler matéria no Globo falando de uma suposta modernidade: as parcerias virtuais. Nem tão muderno assim, devo dizer: tudo depende do parceiro ou parceira com quem se esteja trabalhando. Eu, que sou pessoa gregária, adoro fazer parcerias. Mas não sou muito fã do sistema Tom & Vinicius de composição _ os dois compondo letra e música juntos, cara a cara, muitas vezes com platéia de amigos, esposas e/ou namoradas, admiradores, discípulos, enfim, um monte de gente olhando, participando e `as vezes "atrapalhando a criação", como eu contei em minha música "Na Casa do Villa". Prefiro o silencio e a intimidade numa hora dessas, sem ninguém por perto, embora já tenha feito músicas cercada pelo mesmo monte de gente quando foi necessário. Por isso mesmo, perdi a chance de me tornar parceira do Vinicius quando ele me convidou. Fiquei encabulada, nos meus vinte e poucos anos, de compor na frente dele e da torcida do Flamengo. Não muito tempo depois, foi-se o Vinicius, e a oportunidade se perdeu.

(Impossível esquecer do Tom fazendo "Águas de Março' e mostrando a letra ainda no rascunho para os amigos, em suas várias versões _ e apontando para minha barriga de grávida (de minha filha Ana) e dizendo "é a promessa de vida no teu coração". E como esquecer a noite em Petrópolis quando Chico e Francis começavam a compor 'Atrás da Porta', e Chico, empolgado com o 'e me arrastei e te arranhei, e me agarrei nos teus cabelos, nos teus pêlos...', arranhou o peito de Francis até tirar sangue? Quem viu, viu...)

Gosto tanto de fazer parcerias que isso chega a impedir minha parceria principal, que deveria ser a minha comigo mesma, e que compõe a maior parte da minha obra. No momento, minhas produções-solo estão encostadas, `a espera de que eu tenha tempo para elas, enquanto, de todos os lados, meus atuais parceiros entopem minha caixa-postal com músicas lindas, que eu não posso deixar de completar. E olha a parceria virtual aí, gente!

O mp-3 foi uma invenção abençoada para compositores tímidos como eu. Em vez de ficar com o parceiro do lado, assistindo a todas as suas tentativas e erros (pois é assim que se faz), a gente tem tempo e calma para ir tentando, mexendo, mudando daqui e dali, até acertar. Vejam bem, falo de letra, não de música. Música é outro barato, a conexão é direta com os deuses, o canal está sempre aberto e o violão nunca decepciona: é pegar e tocar, e já sai alguma coisa que preste. Mas com as palavras é diferente: a responsabilidade pesa, `as vezes uma vírgula no lugar errado muda tudo, e eu acabo levando um tempão pra dar o texto por encerrado antes de apresentar para o parceiro.

Mas cada um é cada um: tem parceiro que gosta de compor junto, tem os que preferem mandar a música ou a letra, tem os que não sabem nem ligar computador, como Dori Caymmi e João Donato, tem os que usam a tecnologia do mp3 caseiro com desembaraço, como Menescal, Carlos Lyra e Zé Renato, tem quem passe a letra por fax, como Paulo César Pinheiro, tem quem grave em estúdio, como Leila Pinheiro e Francis Hime, tem de tudo um pouco. E olha que estou falando só das parcerias mais recentes...

Donato, nos últimos tempos, descobriu a pólvora: faz a primeira parte da música e entrega para a parceira (que sou eu, no caso) terminar a melodia e fazer a letra. Espertinho. Já vi que ele está fazendo assim com outros parceiros também, mas não sei se tem dado certo. Comigo deu, e eu ainda capricho nas segundas partes para que fiquem com a cara dele, como foi em 'E Vamos Lá', que fizemos num camarim do Blue Note Fukuoka, no Japão. Faz algum tempo, fui com o Tutty visitar a gostosa casa de Donato e Ivone na Urca, e saí de lá com três novas parcerias _ melhor dizendo, duas e meia, pois uma ficou ainda por completar. Ele gosta de trabalhar junto, no sistema cara a cara. Eu levo a música pronta pra casa e trabalho na letra depois. De memória, mas tem funcionado direitinho.

Bom mesmo é quando a parceria, virtual ou não, dá certo, e depois aparece lida e relida na voz de outra pessoa. A música então ganha vida própria e sai pelo mundo. Mas aí já estamos falando dos intérpretes, que é um outro capítulo.


domingo, março 09, 2008

Omara-me, Bethania-me, Havana-me

E eis que aí estou eu, na noite de ontem, deslavadamente tietando Omara Portuondo nos bastidores do show que ela divide com Bethania no Canecão. Mas não era pra menos. As duas cantam no show um bolero que fiz com meu parceiro Paulo César Pinheiro, chamado 'Havana-me'. Ter músicas cantadas por Bethania sempre foi uma alegria e uma honra pra mim. Mas com Omara, passou dos limites, especialmente por ter sido esta canção em particular.

Quando estive em Cuba pela primeira vez, em 1985, eu estava num momento particularmente raro. Depois de muitos anos sem sair do Brasil, recebi três convites para lugares 'exóticos', onde eu nunca estivera antes: Moscou, Havana e Tóquio. A viagem ao Japão seria a primeira de muitas e o começo de uma relação estável de trabalho _ mas eu ainda não sabia disso quando fui a Cuba para participar de um evento político sobre a dívida externa latino-americana. O que pra mim não passava de um pretexto para realizar o sonho adolescente de conhecer Cuba e ouvir ao vivo a música que durante anos me apaixonara. Ou seja: as magníficas orquestras cubanas, a rumba, o bolero, e por extensão, artistas como Omara.

Comprei um LP dela nesta primeira viagem e muitos outros também, de Bola de Nieve, Los Van Van, Pedro Luis Ferrer, Silvio Rodriguez, Pablo Milanés e muitos mais. E na minha primeira noite em solo cubano, olhando o mar do Caribe pela janela do quarto que eu dividia com minha amiga Clara Sandroni no Hotel Tritón, peguei o violão _ e o bolero nasceu com estas palavras: havaname, cubaname, serename, assim em espanhol mesmo. Depois, já no Brasil, Paulinho Pinheiro desenvolveu este mote, e eu gravei este bolero no meu disco 'Ilha Brasil'.

Há pouco tempo atrás, Bethania pediu a Paulinho uma canção para compor o espetáculo dela com Omara, e ele se lembrou do nosso bolero. Dito e feito, e além do mais ele escreveu versos adicionais onde elas completam: 'bethania-me', 'omara-me', 'baiana-me'. Mão na luva, perfeito. Diretamente do produtor ao inspirador.


terça-feira, março 04, 2008

ainda a praia

O primeiro encontro (vejam foto acima) já tinha sido ótimo, divertido, como mostrei a vocês no post anterior a esse. Mas o show foi ainda melhor.

Vozes de várias gerações, sendo a minha geração a do meio, a 'média guarda' da bossa, como eu costumo dizer. Houve polêmica sobre algumas indicações, principalmente no caso de Fernanda Takai, por ela ser artista pop. Mas devo dizer que ela se saiu super-bem no seu papel de narinhaleoa da nova geração, cantou com segurança e balanço, o que, pra quem vem da rigidez do universo pop, não é pouca coisa. E além de tudo, é uma gracinha de pessoa. Foi uma figura mais do que bem-vinda, e sua presença no show foi um plus, todo o mundo adorou.

Maria Rita é sempre ótima cantora, brilhante como sempre. Torço muito por ela e principalmente para que não a sufoquem as plumas e os paetês do estrelato, a que ela foi submetida, talvez cedo demais. Sempre temo ver alguém talentoso assim perder a festa pra não cair do salto alto. Isso não é uma crítica, mas a torcida sincera de uma velha tia que a viu ainda nas fraldas. A vida é a arte do encontro, dizia meu padrinho Vina. Embora haja tanto desencontro pela vida...

Minha amiga Lelê tem sido presença querida nos últimos tempos _ e talvez, no momento, a minha intérprete mais constante, já que seus recentes CDs e DVDs têm tido sempre músicas minhas, que ela canta com brilho, paixão e precisão certeira. Sorte minha. No particular, a gente sempre se diverte nos encontros, principalmente depois que descobrimos o quanto somos confundidas uma com a outra. Nunca entendemos muito por que, já que ela, além de tudo, é bem mais nova do que eu, e sequer somos físicamente parecidas. Deve ser identificação por assunto, imagino. A pessoa vê uma de nós e pensa "de onde eu conheço? ah, já sei, cantora de boa MPB", ou de bossa-nova, ou qualquer coisa assim. O fato é que ela já recebeu parabéns pela música que fez para as filhas (Leila??? filhas???), eu já recebi mimos da tripulação de um vôo e no final ouvi um "boa sorte, Leila!" _ e outros possíveis constrangimentos, para quem errou, não pra nós, que morremos de rir com isso. No show da praia, eu tinha uma entrevista ao vivo marcada com uma TV, nos bastidores, antes do espetáculo. Dali a pouco entra Leila no camarim `as gargalhadas. Ela tinha dado a entrevista, e no final o repórter ainda agradeceu: "muito obrigado, Joyce!"

O melhor de tudo nessa noite foi lançar uma música nova com Donato. Temos composto bastante juntos _ ando em fase de muitas e boas parcerias, graças a Deus _ e Donato quis experimentar uma das novidades no show. De início foi difícil vender a idéia, pois a produção queria um repertório só de clássicos da bossa-nova, o que de fato rolou. Mas Ivone, jornalista e casada com o Donato, sacou da manga um argumento irrefutável: "gente, a bossa é nova!" E foi assim que nossa música novíssima, "No Fundo do Mar", entrou suingada e dançante no palco de Ipanema, com o público já cantando junto, pra nossa alegria. A bossa é nova mesmo!

PS- pra quem quiser ver um pouquinho da festa, aqui vai uma amostrinha:
http://www.youtube.com/watch?v=Yrqe1SMQE1Q