quarta-feira, janeiro 23, 2008

sessentista


Baby-boomer, soixante-huitarde, sex-ah!-genária. 'Miss Sixty' é o nome de uma loja que só tem roupas para menininhas de 15. Que injustiça. Oui, madame Collange, li seu brilhante livro, bien sûr, e concordei em quase tudo com a senhora: temos uma segunda vida a partir dos 55, por aí. Cada um(a) sabe a dor e a delícia de ser o que é.

Os 200 anos da chegada da corte a mim afetam muito pouco, a não ser se pensarmos na inauguração do Jardim Botanico. A gente vira uma palmeira-mater e pronto! ficamos lá expostas e `a disposição do distinto público. Já a abertura dos portos `as nações amigas me interessa mais. Os portos das nações amigas é que estão completamente abertos pra música que fazemos. Cuja senhora sua mãe faz 50 anos neste ano também. E seu primo 68, aquele safadinho que começou libertário e acabou na cadeia pela tranca do AI-5, é um quarentão simpático hoje experimentando as agruras e alegrias do poder. Oba oba, vivi (quase) tudo isso, fui bossa-novinha nos anos 60, politizada em 68, hippie em 70, e tudo valeu a pena pois a alma não era pequena. Pelo menos quero acreditar que não.

A turma toda vai comparecer `a minha festa de arromba, assim espero. Falta ainda uma semana e vai ser divertido ficar sexy, ainda que depois eu reclame da artrose e de todas as possíveis mazelas da idade. Mas vou poder pagar meia no cinema, então viva!


domingo, janeiro 20, 2008

loucos pelo Brasil

Faz uns dois dias, participei de um show numa pequena casa noturna aqui do Rio, em homenagem ao produtor (e músico) japonês Kazuo Yoshida. Ele aparece na foto acima trocando idéias com Rodolfo Stroeter _ os dois co-produziram meu CD 'Rio-Bahia', feito em parceria com Dori Caymmi em 2005. Foi um dos inúmeros CDs meus de que ele participou como produtor, e certamente não o último.

Conheço Yoshida desde minha primeiríssima ida ao Japão, em 1985, quando fui selecionada para participar do Yamaha Festival. Era um festival ainda competitivo, ou seja, as músicas seriam premiadas, do mesmo jeito que aqui se fazia nos antigos festivais da canção, só que os concorrentes não se inscreviam para participar: ao invés, eram convidados diretamente pela direção do festival, que usava como critério da escolha a carreira e obra anterior do possível convidado. Resolvi ir, embora descrente do formato do evento, pois seria uma oportunidade imperdível para ir ao Japão, de onde já me chegavam boas notícias sobre o interesse do público pela minha música. Acabou sendo uma viagem inesquecível pra mim e o início de grandes amizades, a começar pelas platéias japonesas.

Não ganhei nenhum prêmio, a não ser um alternativo que muito me honrou, dado pelos músicos da orquestra (pode haver prêmio melhor que esse?) E conheci e toquei com o grupo local Spic and Span, especializado em música brasileira e liderado justamente por Kazuo Yoshida, que a partir daí viria a produzir não só vários CDs meus, mas de meio mundo na música criativa do Brasil, com foco na bossa-nova.

A bossa estava em peso na festa do Yoshida: João Donato, Menescal, Carlos Lyra, Wanda Sá, todos tocaram com ele nessa noite (tocamos, melhor dizendo, embora eu não seja exatamente da bossa-nova _ ou seja, sei lá, depende da disposição dos promotores dos eventos...) Foi uma noite divertida e um merecido afago num dos maiores apaixonados pela música do Brasil que eu conheço.

Yoshida tem produzido todas essas pessoas e também cantoras novas como Kay Lyra, Mariana Leporace, minhas filhas Clara e Ana, Sanny Alves e outras mais. Tem trabalhado com músicos importantes da cena bossa-novista brasileira. Tem sido, enfim, um saudável maluco ajudando a nossa música no exterior, muito mais do que qualquer organismo oficial _ esses, em geral, não ajudam em nada. Graças a produtores como ele e como o anglo-indiano Joe Davis, entre outros, muitos de nós temos conseguido realizar nossos projetos sem a dependencia insana de patrocínios, empresas, burocratas e governos. Benditos malucos pela música do Brasil.


domingo, janeiro 13, 2008

woman is the nigger of the world

Já dizia Yoko Ono, lá atrás nos anos 7o: woman is the nigger of the world. O que é feminina? eu disse, e passei a minha vida toda tentando explicar/entender o que nos faz tão diferentes, o que nos oprime, o que nos falta, o que nos sobra. Seria tão simples procurar apenas pelos aspectos subjetivos de ser mulher... A encrenca é muito maior se olharmos para a África, para o mundo muçulmano, e nos reconhecermos na opressão nossa de cada dia. Com o desafio de não cair na tentação do discurso vitimizado da minoria _ e que raio de minoria é essa, que é metade da humanidade?

(vejamos, por exemplo, aqui mesmo no Brasil: quanto tempo e energia me custou para provar que eu podia ser compositora além de cantora, ou seja, criar e pensar por mim mesma, ao invés de apenas ser a porta-voz de idéias alheias? E pra ser band-leader e obter o respeito de outros músicos? Apenas toda uma vida.)

O mundo discute se os Estados Unidos terão um presidente negro ou uma presidente mulher. Eu cá mantenho meu ponto de vista: estou certa de que quando todos os problemas do planeta forem resolvidos e não existirem mais diferenças raciais, sociais ou religiosas, ainda assim, em algum lugar de Soweto ou da Mangueira, da Avenue Foch ou de Ipanema, alguma mulher estará sendo oprimida de algum modo, pois é garantido que a última questão não-resolvida será sempre a questão de gênero.

(e olha que eu simpatizo `a beça com Barack Obama _ portanto, esta não é uma declaração de apoio nem desapoio a Hillary Clinton, nesta eleição onde, por justiça, o planeta inteiro deveria ter direito a voto. É só a constatação de um fato: ser premiada na loteria da vida com o gênero feminino não é moleza não!!!!)

É pior ser mulher do que ser negro? pergunta a jornalista americana, em face da dúvida dos eleitores na escolha do(a) candidato(a) do partido Democrata. Se ela tiver lido o livro 'Infiel', de Aayan Hirsi Ali, saberá com certeza: ser mulher é zilhões de vezes mais complicado.

Não vou explicar nada. Leiam o livro, é urgente. Depois de ler um livro desses, não dá pra não ser feminista. Nem aquelas que, como eu, achavam que não precisavam mais do rótulo.


quinta-feira, janeiro 10, 2008

paraíso tropical

Vejam, no melhor estilo 'onde está Wally?', o sagüizinho aí da foto. Uma graça, a não ser pelo fato de que come ovos de passarinhos ainda no ninho (este ano eles não vieram, e os passarinhos da minha rua se reproduziram lindamente) e pelo outro fato, tenebroso, de que uma epidemia de febre amarela pode estar em curso no Brasil, começando pelos macacos e chegando rapidamente aos humanos.

Em 2002, quando eu e minha filha mais nova tivemos dengue hemorrágica, uma carta indignada que escrevi aos amigos acabou sendo publicada na imprensa e causou repercussão inesperada. Apareci em capa de revista (praticamente dada como morta, é verdade), equipes de rádio e TV ficavam de plantão na minha porta, enfim, uma loucura que eu jamais teria previsto. A questão maior era o teor da carta, que colocava em dúvida as informações sobre a doença que estavam sendo veiculadas naquele momento. E o fato de que ninguém parecia saber se o mosquito era federal, estadual ou municipal, uns empurrando para os outros a responsabilidade. Finalmente, depois de muita pressão, resolvi ir ao RJ-TV, na TV Globo, para acabar logo de uma vez com esse assunto.

Junto comigo, na entrevista, estava um especialista em saúde pública e doenças tropicais. Quando o programa já ia terminando e o entrevistador iniciava as despedidas, pedi licença para uma última pergunta, e indaguei do médico: 'doutor, o mosquito de dengue é o mesmo da febre amarela, não é?' 'Sim, claro', ele disse. 'Então', eu perguntei, 'pode ser apenas uma questão de tempo?' Ele concordou, com ar desolado.

(Pois é, eu e meus exercícios de futurologia... Minha família acha graça até hoje quando lembramos de que no início da década de 80 eu tive um insight e disse: um dia, daqui a não muito tempo, cada pessoa terá seu próprio telefone e vai andar pela rua falando sózinha. Era eu 'inventando' o celular.)

E taí a minha previsão sobre a febre amarela _ de volta, infelizmente, quase um século depois de ter sido erradicada. Aqui em Pindorama vamos caminhando a passos largos em direção ao passado. O futuro é hontem.

PS- eu e Tutty estamos vacinados desde o ano 2000, quando viajamos para a África. Vocês já estão?


domingo, janeiro 06, 2008

divina música

Confesso que apesar de ter minha opção religiosa bem clara, sempre tive certo pudor com relação a uma ligação explícita entre música e fé. Talvez porque nos dias que correm isso tenha virado sinônimo de gritaria, música de quinta e pastores eletrônicos ao estilo americano. O que aqui no Rio deu origem ao movimento 'Deus não é surdo', organizado por moradores que não agüentavam mais a barulheira do culto evangélico na vizinhança (ah, a criatividade do carioca!)

Mas não dá pra negar a proximidade das coisas, e como o assunto é longo, acho que vai durar mais do que um post. Tem muito a ser lembrado sobre isso, de Bach a John Coltrane _ aliás, a razão pela qual escrevo sobre o assunto é o livro 'A Love Supreme', de Ashley Kahn, que relata a criação do álbum clássico de Coltrane e sua conexão com a espiritualidade.

Por enquanto, vai aí a minha foto em 2001, durante a gravação do CD 'Ouro Negro', com os queridos João Donato e Moacir Santos. Dois músicos divinamente inspirados, cada um com suas crenças. João, por exemplo, é um evangélico light. Já Moacir tinha suas particularidades nesse departamento: acreditava nos 'gandarvas' (espíritos da música), nos 'devas' (anjos) e em toda uma ligação entre o Divino e a vida na Terra através dos sons. Vejam o que diz o nosso genial Moa no texto que escreveu para o último CD da Banda Mantiqueira:

"O que me espanta sobremaneira é, nesse mundo de mais de 12 bilhões de seres vivos, o fato de o Criador dos Universos fazer cada um de nós uma chispa Dele, original!"

Traduzindo Moacir: somos 'chispas' de Deus, ou seja, fazemos parte de e nos movemos em Deus. A música é o idioma universal, cada um de nós é absoluto no seu momento da criação. Nosso maestro soberano Tom disse com todas as letras, numa entrevista para a TV, que a finalidade de sua música era "levar as pessoas para a felicidade, levar as pessoas para Deus". Como é lindo alguém que não tem medo de dizer essas coisas, ainda mais quando é um músico genial de verdade.


sexta-feira, janeiro 04, 2008

Lady Victoria

Tem gente que é de gato, tem gente que é de cachorro. Tem gente que é de passarinho (eu adoro, e tenho vários que aparecem voando diante da minha janela, quando querem _ e só quando querem). Tem gente que é de coelho, como uma família amiga nossa que tem um coelho dentro do apartamento _ acredite quem quiser. Já estão no segundo.

Eu já fui de gato (cat people, como diz Carlos Lyra), tive alguns, hoje sou completamente de cachorro (dog people, claro). Perdi a conta de quantos passaram pela minha vida. Só sei que houve um tempo em que tudo o que era bicho abandonado vinha parar na minha porta, na nossa antiga casa do Jardim Botânico. Era um apartamento térreo, com algum espaço para essas coisas. Depois mudamos pra uma casa (essa sim, espaçosa) no Recreio, com quintal e canil. Tivemos muitos cachorros e um gato vira-lata chamado Gatón que morreu envenenado por uma vizinha, que não gostou de ele ter-lhe engravidado a gata cheia de pedigree.

Pois aí estou eu na foto com a Vicky, springer spaniel de 10 anos que veio pra nós em substituição `a Luna, minha grande amiga. Quando a Luna morreu (era uma mistura de lhasa apso com cocker, mal-humoradíssima, mas nós nos adorávamos) jurei que não teria mais cachorro em casa. Doce ilusão. Nossa filha mais nova pediu tanto que viesse outra, que acabou conseguindo.

Vicky cresceu achando que é gente, pois nossa filha deixava que dormisse na cama com ela, entre outros mimos mais. Agora, com sua verdadeira dona morando fora do Brasil, sobrou pra nós, é claro. Ficamos responsáveis por ela, ou vice-versa. Dog people total.

Cachorros são fiéis, desinteresseiros, apesar de `as vezes manhosos (Vicky é muito, e de vez em quando fica bastante enjoadinha). Mas amor incondicional, mesmo, de verdade, só tem dois: de mãe e de cachorro.