Nestes tempos em que parece que nada mais vai acontecer de novo e que todas as grandes canções já foram feitas no século passado, dá uma alegria enorme quando a gente ouve um CD como "Litoral e Interior" do nosso amigo queridíssimo (e meu parceiro eventual) Sérgio Santos (na foto acima, num momento-litoral em Olinda, com o Tutty. Mas ele é interiorano, mineiro de Varginha). O disco é lindo, cheio de sonoridades belíssimas, músicos de exceção e, mais do que tudo, grandes canções.
O formato "canção" não acabou ainda, como pregam alguns - eu mesma cheguei a fazer esta previsão em entrevistas, anos atrás. Mas estava enganada. Canções como "Lá Vem Chuva" ou 'Ventando na Areia', do CD novo do Sérgio, dão nova dimensão ao gênero. Ele brinca com os tempos, compassos quebrados, harmonias tortas, de uma forma tão natural que a gente nem nota. Isso é saber compor, isso é ter o dom. É composição na veia.
Há poucos grandes compositores em atividade no momento na música brasileira, e Sérgio Santos é um deles. Muitos dos que construíram o grande cancioneiro do Brasil parece que andam cansados, sem coragem, desanimados, sem tesão em compor - ou simplesmente 'perderam a mão'. "Litoral e Interior" é um disco de inéditas. Viva! Lembra um pouco (sem se parecer em nada) o "Urubu", do Tom, aquele que abria com ele e Miúcha cantando 'O Boto', e desaguava nas grandes veredas orquestrais de 'Saudades do Brasil'. O disco do Sérgio também tem essa mistureba cancionista/instrumental/orquestral, com André Mehmari no papel de Claus Ogerman, e Dori Caymmi as himself. Pura e grande música.
O que me remete à minha também parceira Léa Freire.
Ela também tem um recente CD belíssimo, "Cartas Brasileiras" (menos recente que o do Sérgio, mas pouquíssimo divulgado), cheio de composições maravilhosas, arranjos sensacionais, grandes instrumentistas, pois é de instrumental que estamos falando. Léa é grande compositora, ou compositor, sem gênero, músico dos maiores que o Brasil já viu nos últimos tempos. Alguém aí, que não seja do ramo ou de São Paulo, conhece a moça?
Generosa com os amigos, ela tem produzido em seu selo Maritaca a fina flor dos instrumentistas de Sampa. Às vezes esquece de si mesma e batalha pela criação alheia como se fosse sua. Graças a seu esforço, tivemos registro recente da obra de Mozar Terra, Filó Machado, Nailor Proveta e tantos mais. Mas antes de tudo, Léa é ela. O grande compositor, o grande músico - por um acaso genético, mulher.
Quem ama a música não deve perder estes dois discos. Corram atrás, procurem, implorem, encontrem, pois não se acha isso todos os dias. A música brasileira está viva e ainda lá. Salve!
PS- Peguei emprestado para este post o título de um belo disco de Nara Leão, de milênios atrás.
PS 2- o CD do Sérgio tem ainda as magníficas fotos de Myriam Villas-Boas, nossa Miroca, com seu olho mágico.
PS 3- uma coisa legal que estou descobrindo pelos comentários é que tem mais gente que já conhece e aprecia essa grande música do que eu imaginava, principalmente no caso da Léa. Mas na verdade, pensando bem, da turma aqui do blog eu não esperava menos!